Por Carta Maior
Onde estão hoje e o que fazem os protagonistas da Cúpula dos
Açores em 2003 – George W. Bush, Tony Blair, José Maria Aznar e Durão
Barroso –, que deram luz verde à invasão do Iraque? Dez anos depois, o
números de mortos de civis iraquianos gera dúvidas, mas está na casa das
centenas de milhares
Lisboa – Em 15 de março de 2003, George W. Bush,
Tony Blair e José Maria Aznar, tendo Durão Barroso como anfitrião,
reuniram-se nos Açores e lançaram o ultimato que desencadeou a invasão
do Iraque, mesmo sem o mandato das Nações Unidas. Dez anos depois,
apenas Barroso se mantém em funções políticas, mas fora do seu país.
Tony Blair queixa-se das ofensas que ouve na rua
O ex-primeiro-ministro britânico Tony Blair reconheceu numa
entrevista recente à BBC que dez anos depois da invasão do Iraque ainda
encontra pessoas “muito ofensivas” em relação a ele, e que desistiu de
convencê-las de que a decisão de invadir foi correta. O entrevistador
perguntara-lhe se se importava de que as pessoas o chamassem de
mentiroso, de criminoso de guerra, e se era difícil andar na rua com
tranquilidade.
A verdade é que Blair já passou pelo menos por quatro ocasiões em que
cidadãos tentaram dar-lhe voz de prisão, executando uma “prisão cidadã”
por crimes contra a paz. A iniciativa foi lançada pelo site Arrest
Blair, que lista quatro objetivos a obter com as “prisões cidadãs”: 1)
lembrar que a justiça ainda não foi feita; 2) mostrar a Blair que os
assassinatos maciços de que ele é responsável não serão esquecidos; 3)
pressionar as autoridades do Reino Unido e dos países por onde ele passa
a processá-lo por crimes contra a paz; 4) desencorajar outros a
repetirem o mesmo crime.
Criminoso de guerra
As acusações de que Blair é um criminoso de guerra têm-se
multiplicado e quem o faz não são só os ativistas antiguerra.
Personalidades mundiais, como o arcebispo Prêmio Nobel da Paz Desmond
Tutu, um dos líderes do movimento antiapartheid na África do Sul, dizem o
mesmo. Tutu foi mesmo mais longe: no final de 2012 defendeu que Tony
Blair e George W. Bush fossem levados diante do Tribunal Penal
Internacional de Haia por terem mentido sobre a existência de armas de
destruição maciça. Tutu argumentou que o número de vítimas provocado
pela invasão e a guerra que se seguiu são mais que suficientes para que
Blair e Bush sejam julgados no TPI.
David Miliband, ex-secretário dos Negócios Estrangeiros e deputado
trabalhista, irmão do atual líder do Labour, é da opinião que “a pior
coisa que aconteceu a Tony Blair foi a eleição de George W. Bush, pela
direção em que este levou o mundo”. O problema é que Blair chegou a
argumentar que a sua proximidade a Bush lhe tinha permitido influenciar
as decisões, mas a verdade é que todas as testemunhas dos bastidores da
invasão agora confirmam que Blair limitou-se a dizer que qualquer que
fosse a decisão de Bush, o Reino Unido apoiá-la-ia.
Blair não reconhece que o seguidismo em relação a Bush foi um erro,
mas não é acompanhado pelos que lhe estavam próximos na altura. No
início de março deste ano, John Prescott, que era o
vice-primeiro-ministro de Blair, disse que a guerra que ele próprio
apoiou “não pode ser justificada”. Prescott disse que tentou justificar a
decisão, mas não conseguiu: “Não pode ser justificada como
intervenção”, reconheceu.
Fim de linha em 2007
A invasão do Iraque foi o início do fim da carreira de Blair. O
primeiro-ministro britânico ganharia ainda as eleições de maio de 2005,
mas a maioria trabalhista de 160 deputados reduziu-se para 66. Em 27 de
junho de 2007, Blair renunciou ao cargo e também ao mandato de deputado.
Logo depois, foi confirmado como enviado da ONU ao Médio Oriente
anunciando um novo plano de paz para a região, que nunca saiu do papel. A
dedicação de Blair ao novo cargo também não foi melhor. Exemplo disso
foi que nos primeiros nove dias da invasão de Israel a Gaza, o
ex-primeiro-ministro manteve-se totalmente alheio, tendo porém sido
visto na inauguração de uma loja Armani em Knightsbridge. Assessores de
Blair disseram depois que ele se mantivera em contacto telefônico com
líderes mundiais desde o início do conflito.
Fortuna pessoal
Calcula-se que a fortuna pessoal de Blair seja de 60 milhões de
libras, a maioria acumulada depois que chegou ao cargo de
primeiro-ministro. Em janeiro de 2008, o ex-líder trabalhista foi
contratado como conselheiro do banco de investimentos JPMorgan Chase e
como conselheiro para questões relacionadas às alterações climáticas do
Zurich Financial Services. Além disso, Blair cobra 250 mil dólares por
uma palestra de 90 minutos. Em julho de 2010 foi revelado que os seus
guarda-costas custam às finanças públicas britânicas 250 mil libras ao
ano.
Bush entrou no ranking dos piores presidentes dos EUA
Quando terminou o seu mandato na Presidência dos Estados Unidos, em
janeiro de 2009, George W. Bush voou para o Texas e desde então tem
vivido discretamente numa casa em Preston Hollow, nos arredores de
Dallas.
As aparições públicas têm sido raras: participação via vídeo no
programa de TV Colbert Report, ao funeral do senador Ted Kennedy,
intervenções em seminários de Motivação, participação, a pedido de Obama
e junto com Bill Clinton, num fundo para ajudar o Haiti. Em 2010,
admitiu ter autorizado o uso de técnicas de tortura como o afogamento e
afirmou que voltaria a fazê-lo “se fosse para salvar vidas”.
Em fevereiro de 2011, desistiu de uma visita que pretendia fazer à
Suíça, temendo as ameaças de protestos durante um discurso que pretendia
fazer em Genebra e sobretudo temendo a possibilidade de ser detido por
ter autorizado o uso de tortura, violando as convenções internacionais
sobre essa prática.
No outono de 2012, a revista ‘New York’ revelou que o ex-presidente
descobrira recentemente a vocação da pintura, e que pintara dois
autorretratos tomando banho e no chuveiro. Mais tarde, revelou-se que
tinha cerca de 50 retratos de cães.
A rede de TV a cabo C-SPAN realizou em 2000 e atualizou em 2009 um
ranking dos presidentes da República dos Estados Unidos, que colocou
George W. Bush entre os piores presidentes da história do país, junto
com Warren G. Harding, Andrew Johnson, Franklin Pierce e James Buchanan.
Duas mentiras derrotaram Aznar
Em dezembro de 2008, o ex-presidente do governo de Espanha, José
María Aznar, reconheceu que não havia armas de destruição maciça no
Iraque. “O mundo inteiro pensava que havia armas de destruição maciça e
não havia, sei-o agora”, disse Aznar num ciclo de conferências. “Quando
eu não sabia, ninguém sabia”, justificou.
Um ano antes já tinha dito que não se arrependia de ter envolvido o
seu país na guerra do Iraque, porque foi “um dos momentos mais
influentes da história do país”. “Nunca me vou arrepender de a Espanha
ter vivido um dos momentos mais influentes da sua história e não me
arrependo disso. Arrepender-me-ia de não ter estado à altura das
circunstâncias”, disse, defendendo que era fundamental estar “ao lado
dos aliados mais fortes possível”.
Nova mentira
Em março de 2004, o PP de Aznar perdeu as eleições depois de o chefe
do governo atribuir à ETA a responsabilidade dos atentados que
provocaram a morte de 191 pessoas e mais de 1.500 feridos. Muitos
cidadãos consideraram que o governo mentia acerca da autoria do atentado
para que não se considerasse que este era uma represália da Al-Qaeda
pelo envio de tropas espanholas para o Iraque. Assim, duas mentiras – as
armas de destruição maciça e a atribuição à ETA da responsabilidade do
11-M – selaram o futuro de Aznar.
“Ecologismo é o novo comunismo”
Derrotado nas eleições, Aznar foi presidir a Fundación para el
Análisis y los Estudios Sociales (FAES), foi nomeado presidente de honra
do PP e tornou-se membro do Conselho de Estado. Em junho de 2006, o
ex-chefe do governo espanhol foi nomeado para o Conselho de
Administração do grupo News Corporation, de Rupert Murdoch, que lhe paga
220 mil dólares anuais pelo cargo.
Aznar foi também nomeado presidente para a América Latina da J.E.
Robert, empresa dedicada a grandes operações imobiliárias nos Estados
Unidos e na Europa e também entrou no Comité Assessor da Centaurus
Capital, uma empresa de capital de risco especializada em hedge funds,
cargo que abandonaria em 2009.
As suas intervenções políticas posteriores foram marcadas fortemente
pelo conservadorismo. Em outubro de 2008, por exemplo, afirmou que o
ecologismo é o novo comunismo, mostrando-se cético em relação aos
perigos das alterações climáticas.
Barroso disse que foi enganado
Em novembro de 2007, numa entrevista à TSF e ao Diário de Notícias,
Durão Barroso afirmou que na Cimeira dos Açores foi enganado: “Houve
informações que me foram dadas, a mim e a outros, que não corresponderam
à verdade. Tive documentos na minha frente dizendo que o Iraque tinha
armas de destruição maciça. Isso não correspondeu à verdade”, disse.
Ainda assim, Barroso defendeu que Portugal nada tinha a lamentar
sobre o papel que assumiu, e a prova disso seria a sua própria situação.
“Portugal, ao dizer que sim ao seu aliado norte-americano, não perdeu
espaço com isso, nem tem que estar arrependido. Eu fui, depois dessas
decisões, convidado a ser Presidente da Comissão Europeia, e tive o
consenso de todos os países europeus.”
A 29 de junho de 2004, Barroso anunciou a sua demissão da chefia do
governo português, para assumir o cargo de 12º presidente da Comissão
Europeia, sucedendo neste cargo a Romano Prodi. Foi substituído no
governo por Pedro Santana Lopes, mas, passados poucos meses, o
presidente Jorge Sampaio dissolveu a Assembleia da República e convocou
eleições antecipadas, vencidas por José Sócrates.
Em 2011, o
ex-presidente francês Jacques Chirac publicou um segundo volume das suas
memórias, “Le temps présidentiel”, onde criticou Durão Barroso pela sua
posição pró-americana na guerra no Iraque, afirmando que avisou
diversas vezes, pessoalmente, tanto Bush como os seus aliados, das
consequências negativas da guerra e da decisão de atacar o Iraque sem
mandato das Nações Unidas.
Retirado do site da Agência Carta Maior.
Fonte: Algo a Dizer e Esquerda.net
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