sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Escravidão urbana passa a rural pela primeira vez no Brasil


Segundo dados sistematizados pela Comissão Pastoral da Terra, 53% dos resgatados em 2013 exerciam atividades nas cidades. Construção civil encabeça lista

O número de trabalhadores resgatados de condições análogas à escravidão em atividades urbanas superou a quantidade de casos ocorridos no campo pela primeira vez desde que dados sobre libertações começaram a ser compilados. De acordo com a Comissão Pastoral da Terra (CPT), que sistematizou informações que vão de 2003 a 2013, 53% das pessoas libertadas no ano passado trabalhavam nas cidades. Em 2012, esse percentual foi de 29%.
A construção civil foi a maior responsável por isso, sendo o setor da economia brasileira com mais casos de resgates em 2013: foram 866 libertados, ou 40% do total. Em segundo lugar, ficou a pecuária, com 264 (12%). A construção civil já havia liderado em 2012, mas com uma porcentagem bem menor: 23%. A pecuária, no entanto, encabeça o “ranking” se contabilizados os casos desde 2003, com 27% das ocorrências, seguida pela cana, com 25%. Chama a atenção o fato de que 24% do total das libertações tenham ocorrido no estado de São Paulo.
“Olhando para os casos de trabalho escravo na construção civil, percebe-se que a maioria deles, se não todos, estão em áreas urbanas. De fato é a primeira vez que os casos de trabalho escravo em atividades não agrícolas ultrapassam os do setor agrícola (neste incluindo as carvoarias)”, diz Xavier Plassat, da coordenação da Campanha Nacional da CPT de Prevenção e Combate ao Trabalho Escravo. O levantamento da entidade tem como base dados da Divisão de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo, do Ministério do Trabalho e Emprego (Detrae/MTE) atualizados até 28 de janeiro de 2014.
A “disparada” de libertações no setor da construção civil difere do observado na última atualização do cadastro de empregadores flagrados com trabalho escravo no Brasil, também do MTE, chamada de “lista suja”. Isso porque esta última inclui casos de resgates acontecidos em anos anteriores. Além disso, as variações dos números de trabalhadores escravos encontrados não refletem necessariamente uma mudança na incidência do problema em determinado setor econômico ou localização geográfica, pois pode também estar relacionado a uma maior ou menor ocorrência de denúncias e inspeções trabalhistas.
De qualquer forma, na última atualização da lista suja, ocorrida em 30 de dezembro, observou-se um crescimento do número de inclusões de empregadores cuja atividade acontece em áreas urbanas: foram 120 trabalhadores submetidos à escravidão em dez estabelecimentos. Em declaração à Repórter Brasil na época, o auditor fiscal em São Paulo Renato Bignami afirmou: “percebe-se cada vez mais que as situações descritas no artigo 149 do Código Penal [que configuram condições análogas à escravidão] ocorrem com maior frequência em atividades urbanas do que se imaginava e o trabalho dos auditores fiscais vem demonstrando essa tendência”. Segundo ele, no futuro os resgates acontecerão “majoritariamente no meio urbano”.

São Paulo lidera

Ainda de acordo com os dados compilados pela CPT, São Paulo, Minas Gerais, Bahia e Pará foram o estados brasileiros com o maior número de trabalhadores resgatados de condições análogas à escravidão em 2013. Os dois primeiros lideraram com folga, com, respectivamente, 538 e 440 casos de libertação, aumento de 125,1% e 26%. Bahia e Pará vêm em seguida, com 149 e 141 casos. O Pará, que havia encabeçado a lista em 2012, com 519 trabalhadores resgatados, teve uma redução de 72,8% em relação ao ano passado. Em número de fiscalizações, no entanto, o estado da região Norte do país continua na frente. Em 2013, ocorreram inspeções em 33 estabelecimentos nessa unidade da federação, contra 23 em São Paulo.
Em 2013, 2.192 pessoas foram libertadas em todo o Brasil , uma redução de 19,7% em relação aos 2.730 de 2012. Segundo a CPT, desde 2003 foram libertados 42.664 trabalhadores. Os estados com maior incidência de pessoas resgatadas ao longo desses anos foram Bahia, Goiás, Mato Grosso e Pará. No ano passado, o Sudeste foi a região com mais resgates: 1.129 (51,5% do total). Houve uma inversão de posições com relação à região Norte. Enquanto esta teve o número de trabalhadores libertados reduzido de 1.054 (38,6% do total) para 274 (12,5%) de 2012 para 2013, na região que engloba Espírito Santo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo ocorreram, em 2012, 623 libertações (22,8%).

Perfil dos resgatados

A partir da análise dos dados do registro do seguro-desemprego (garantia dada a todos os libertados) de 2003 até 15 de outubro de 2012, a CPT concluiu que, de um total de 28.702 trabalhadores encontrados em condições análogas à escravidão, o Maranhão foi o estado de onde veio o maior número de vítimas (25,5%), seguido de longe por Pará, Minas Gerais e Bahia (8,2% cada). Quase dois terços dos libertados tinham entre 18 e 34 anos (63,6%), 73,7% eram analfabetos (35,3%) ou haviam estudado até o 5º ano incompleto (38,4%) e 95,3% eram homens.

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

O catador que virou bode expiatório de Junho


Direto de Bangu 5, entrevista com o único condenado pelos protestos: o perigoso homem que carregava dois frascos de PinhoSol e agora cumpre pena de cinco anos
Por Matias Maxx, na Vice
Rafael Braga Vieira fez 26 anos dia 31 de janeiro. Nascido e criado na Vila da Penha, no Rio de Janeiro, trabalhava como garimpeiro urbano, coletando antiguidades e objetos usados no lixo para vender no “Dingo Mall” como é conhecida a feira de coisas usadas montada por moradores de rua nas proximidades da feira de antiguidades da Praça XV. No dia 20 de Junho de 2013, a PM carioca utilizou cavalaria, Tropa de Choque, muitas bombas e o famigerado Caveirão contra as centenas de milhares de pessoas que se manifestavam contra o aumento das passagens em frente à prefeitura. Enquanto alguns resistiam com escudos e barricadas, impedindo o avanço da tropa, vários manifestantes se espalharam pelo centro ateando fogo em lixo e quebrando vidraças de bancos. Por volta das 18h, Rafael, que diz nunca ter participado de manifestação nenhuma, voltava de seu garimpo para um sobrado abandonado onde ele morava. Ele declara que lá encontrou duas garrafas de produtos de limpeza que pretendia levar para uma tia, quando foi abordado por PMs e conduzido à delegacia, onde as garrafas se transformaram em coquetéis molotovs.
Rafael foi condenado no estatuto do desarmamento, por posse de explosivos e cumpre a pena de cinco anos no Presídio Elisabeth Sá Rego, também conhecido como Bangu 5. Trata-se de uma penitenciária de regime fechado, destinada normalmente a condenados ligados à facção criminosa Comando Vermelho, que controla a comunidade onde Rafael foi criado. Mesmo sem envolvimento com o crime organizado, o fato de ser cria de uma comunidade dominada por uma facção rival costuma ser uma sentença de morte no sistema prisional do Rio de Janeiro. Acompanhado de agentes e da assessoria de imprensa da SEAP, conversei por vinte minutos com Rafael. Com fala mansa e um triste conformismo, ele me contou a história da única pessoa condenada após ser presa nos protestos que tomaram conta do país desde junho do ano passado.
140205-PinhoSol
Me conta, o que aconteceu no dia 20 de Junho?
Rafael Braga Vieira: Tinha manifestação no centro, e eu estava chegando do trabalho e fui para o casarão onde eu morava. Quando eu saí, os PMs já me abordaram e falaram que eu estava com coquetel molotov na mão, mas eu não tava com coquetel molotov nenhum… Era uma garrafa de Pinho Sol que achei quando eu cheguei no casarão. Lá é aberto, é um casarão que foi invadido, na hora que eu cheguei lá, tinha essa garrafa e uma daquelas garrafas verdes de cloro… Aí pegaram a garrafa de Pinho Sol e esvaziaram, botaram lá algo que eu acho que era gasolina, amarraram um paninho e falaram que era coquetel molotov perante ao juiz. Só isso…

Você morava nesse casarão?
Eu morava sozinho nesse casarão aberto que tem na Lapa, dormia lá. Sou camelô, trabalho na feira da Praça XV. Como eu não tinha lugar para guardar minhas coisas, guardava lá. Minhas peças usadas. Trabalho com peças usadas, peças raras, não tenho nada a ver com essa manifestação aí. Nunca participei, nunca vi…

Você foi assistido por algum advogado quando foi preso?
Quando fui preso vieram dois advogados que me acompanharam, assinei até um papel lá com eles… Foram até lá na casa da minha família…  Mas só isso mesmo… Não sei se tão acompanhando ainda, não pediram dinheiro… Lá no juiz eu tava com a Defensoria Pública…

E você viu os PMs esvaziando a garrafa?
As duas garrafas estavam lacradas quando eu peguei, não era molotov não. Peguei porque tem uma tia minha que mora lá no outro casarão do lado desse onde eu moro, eu ia dar pra ela. Aí eles me abordaram na saída do casarão, que fica de frente à delegacia das crianças lá na Lapa. Nem tinha visto eles quando eu saí, estava carregando as garrafas na mão, já chegaram me agredindo já, me deixaram no portão e seguraram as garrafas. Me levaram lá pra 5ª [DP], e lá as garrafas já estavam com gasolina. Eles esvaziaram e colocaram gasolina pra dizer que era coquetel molotov, mas isso não tem nada a ver não. Falaram isso pro juiz e ele foi e me condenou sei lá por quê, acho que é porque eu já tenho passagens.

Quais foram essas passagens?
Cheguei a ser condenado já em outras passagens por roubo. Cumpri pena e saí por ordem do juiz, saí de condicional e eu tava trabalhando tranquilão na paz de Deus, aí aconteceu isso aí.

E em quais presídios você passou antes de chegar aqui em Bangu 5?
Primeiro eu fui pra Japeri, depois pro setor B e ai me mandaram pra cá. Me mandaram pra cá. Eu tô aqui mesmo porque eu sou morador da comunidade da Penha, desde pequeno, minha família é de lá… Aí me botaram aqui.  O convívio é tranquilo, tranquilão… Mas não tenho recebido visita, porque aqui fica um pouquinho distante pra eles.

Você acha que foi preso injustamente?
Fui preso injustamente com certeza, é porque eu tive duas passagens, por isso aí… Eu não fiz nada, sou inocente de verdade. Mas já fui condenado mesmo, o juiz me condenou, cinco anos… Tô pagando…

E o que você pretende fazer quando sair?
Quando sair pretendo voltar a trabalhar mesmo, resolver minha vida, arrumar um trabalho de carteira assinada que é melhor, ajudar minha família. Eu que ajudo minha família em casa, o mais velho dos irmãos sou eu. Minha mãe não tem marido. Tá morando sozinha agora, comigo somos sete irmãos e eu que ajudava.

E agora? Como eles estão se virando?
Pô! Não tenho nem notícias. Não sei como o pessoal tá se virando aí.

Me conta mais sobre seu trabalho na Praça XV.
Trabalho lá há muito tempo, desde os treze anos de idade. Vendo peças usadas que acho no garimpo, sou garimpeiro. Vou juntando lá no casarão, levo pra feira, espalho lá e começo a vender, pra arrumar dinheiro. Tudo que eu acho, liquidificador, televisão, aí eu alugo uma barraca lá e armo. É maneiro. Televisão funcionando, coisas boas que eu acho no lixo… Tudo vende lá cara, até peça ruim vende lá (risos), os caras compram pra tirar alguma coisa. Pô! Porcelana! Porcelana dá dinheiro legal, jarrinhos, quadros antigos, molduras… Eu tirava um dinheiro lá, de 300 a 500 por semana. Dava pra ajudar minha família tranquilo…

Eu ficava três semanas ali por baixo, ia pra casa lá na Penha, ficava uma semana em casa… Acabava ficando mais tempo lá embaixo do que em casa. Só ia lá em casa mesmo pra levar um dinheiro pra minha família, tô com duas irmãs recém-nascidas. Minha mãe chegou até a trabalhar comigo lá, mas não tava dando mais não…
Você já tinha participado de alguma manifestação? Ou sabe o porquê dessas manifestações?
Na manifestação anterior eu nem tava por perto. Nem sei por que estavam rolando essas manifestações. Não sei de nada, eu tava só voltando do trabalho, vi aquele monte de gente e aí isso aconteceu do nada. Tava vindo do Largo do Machado, eu garimpo lá, em Laranjeiras. Foi eu chegar e aconteceu isso comigo, mais ou menos umas seis horas da tarde.

Quatro meses depois, quase 200 pessoas foram presas numa manifestação, chegaram a passar um tempo aqui em Bangu, mas já foram todos liberados. Por que você acha que é o único que foi condenado e continua preso?
É… Só eu… É porque eu já fui condenado antes por roubo. Realmente, estava roubando, mas parei com isso, não quero mais saber de roubo, nem de mais nada dessa vida. Estava trabalhando tranquilão na rua, tô voltando do trabalho aí o cara pega, me agride. E acho que porque eles me agrediram lá na frente de um monte de pessoas eles tiveram que esvaziar aquilo ali e dizer que era molotov. Já tinham me agredido, já foram me chamando, falando que eu tava no meio…  “Você tava ali né? No meio daquela bagunça ali né?”, tava nada. Falaram  pro juiz que já tinham me visto por lá, que tinham me visto com uma mochila, realmente eu andava todo dia com mochila, vindo do meu garimpo, várias bolsas só com as peças usadas que eu achava no lixo. Eles falaram pro juiz que eu andava com bolsas. Pô! Nada a ver! Forjado. Foi tudo forjado.

Então você acha que eles inventaram essa história na delegacia para justificar o abuso de autoridade que tinham cometido antes?
Isso! Eles chegaram me agredindo à pampa, me deram coronhada, bateram minha cabeça na parede da delegacia. Tinha um montão de policial lá mesmo, dois já me levaram lá pra dentro já me metendo a porrada, chegaram lá dentro acabaram de me arrebentar e colocaram no “porquinho”, me deixaram um tempão lá e depois me chamaram, “tua casa caiu, não sei o quê…”. Aí me levaram pra 5ª e apresentaram a garrafa de Pinho Sol já com gasolina e com um pano na garrafa. Só isso mesmo. Falaram que era molotov, eu falei que não era. Mas não tava ninguém comigo, eu tava sozinho. Mas um montão de gente que tava com molotov mesmo foi tudo embora. Tudo liberado. Eu não tava com nada disso não e fui condenado.


quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

"Os Reacionários Devem Ser Castigados" - Mao Tsetung


Hoje, 1 de Agosto, estamos aqui reunidos para um comício em celebração de finados. Por quê tal comício? Porque os reacionários assassinaram camaradas revolucionários, combatentes que resistiam ao Japão. Quem é necessário matar atualmente? Os traidores e os imperialistas japoneses. Já lá vão dois anos que a China se bate contra os imperialistas japoneses, mas ainda não está determinado o vencedor e o vencido. Os traidores permanecem muito ativos; muito poucos dentre eles foram executados. Em contrapartida, os camaradas revolucionários, os combatentes da resistência contra o Japão são os que são massacrados. E por quem? Pelo exército. Por que é o exército mata combatentes da resistência contra o Japão? Porque executa ordens, porque lhe deram a ordem de matar. Quem lhe deu essa ordem? Os reacionários(1). Camaradas! Quem está, logicamente, interessado na morte dos combatentes da resistência contra o Japão? Primeiro, os imperialistas japoneses e depois os traidores e os vende-pátrias, como Uarn Tsim-vei. Mas agora o local do assassinato não foi qualquer dos pontos ocupados pelos japoneses e traidores, Xangai, Pepim, Tientsim, Nanquim, mas sim Pinquiam, na retaguarda anti-japonesa, e entre as vítimas figuravam Tou Djem-cuen e Luo Tse-mim camaradas responsáveis pelo Birô de Ligação do Novo IV Exército em Pinquiam. Está evidente que esse crime foi o gesto duma quadrilha de reacionários chineses que agiu por ordem dos imperialistas japoneses e de Uam Tsim-vei. Os reacionários preparam-se para capitular, sendo por isso que obedecem servilmente as ordens dos japoneses e de Uam Tsim-vei, e fizeram dos combatentes mais resolutos da resistência anti-japonesa as suas primeiras vítimas. Trata-se duma questão que não é insignificante, é um fato que temos de denunciar e contra o qual devemos elevar o nosso protesto.

Atualmente, o país inteiro resiste a agressão japonesa e a causa da resistência forjou uma grande união entre a totalidade do povo. Contudo, no seio dessa grande união encontram-se também reacionários, capitulacionistas. E o que fazem estes? Matam os combatentes da resistência anti-japonesa, impedem o menor progresso, agem em colusão com os agressores japoneses e os traidores, e preparam-se para capitular.

Houve já alguém que tivesse tomado em mãos essa grave questão que é o assassinato de que foram vítimas camaradas nossos da resistência anti-japonesa? Eles foram mortos as três da tarde do dia 12 de junho e hoje já estamos a 1 de Agosto. Durante todo este tempo, acaso vimos alguém ocupar-se da questão? Não. Quem deveria ter-se ocupado? A lei chinesa, os juízes. Se fato semelhante se tivesse produzido na região fronteiriça Xensi-Cansu-Ninsia, há muito que o nosso tribunal supremo teria intervindo. Mas já cerca de dois meses se escoaram após esse Incidente Sangrento de Pinquiam e a lei, os juízes, ainda não estão em ação. Qual será então a causa desse estado de coisas? É o fato de a China não estar unificada.(2)

A China precisa de ser unificada pois doutro modo não poderá vencer. E que significa unificação? Significa que todos devem resistir ao Japão, que todos devem unir-se e concorrer para o progresso, havendo que recompensar e punir equitativamente. Quem se torna necessário recompensar? Os que resistem ao Japão, os que são pela união e pelo progresso. Quem se torna necessário punir? Os traidores e os reacionários, que sabotam a resistência, a união e o progresso. O nosso país está unificado neste momento? Não. O Incidente Sangrento de Pinquiam é uma prova disso. Ele mostra que a unificação ainda não está realizada ali onde devia estar. Há já muito que estamos reclamando a unificação do país. Primeiramente, uma unificação baseada na resistência. No entanto, nesta altura, longe de terem sido recompensados, Tou Djem-cuen, Luo Tse-mim e outros camaradas da resistência anti-japonesa foram selvaticamente massacrados, ao passo que continuam sem punição os miseráveis que fazem campanha contra tal resistência, que se preparam para capitular e recorrem ao assassinato. Isso não é unificação. Há que lutar contra esses miseráveis, contra esses capitulacionistas e deter esses assassinos. Segundo, urna unificação baseada na união. Os partidários da união deveriam ser recompensados e os sabotadores punidos. Contudo, são Tou Djem-cuen, Luo Tse-mim e mais camaradas partidários da união, os que foram punidos, assassinados selvaticamente, e os miseráveis que sabotam a união escapam a todo o castigo. Não é isso unificação. Terceiro, uma unificação baseada no progresso. O país todo tem de progredir, os retardatários devem procurar acertar o passo pelos mais avançados e estes não devem ser puxados para trás em alinhamento com os retardatários. Os carrascos de Pinquiam mataram progressistas. Desde que começou a Guerra de Resistência, os comunistas e demais patriotas assassinados contam-se já por centenas, não sendo o Incidente Sangrento de Pinquiam mais do que o último em data. Se se continuar assim, a China correrá para o desastre: todos os que resistem ao Japão arriscam-se a ser massacrados. Que significam esses assassinatos? Significam que os reacionários chineses, executando ordens dos imperialistas japoneses e de Uam Tsim-vei, preparam-se para capitular. Assim, há primeiro que matar os militares que se batem contra o Japão, matar os comunistas, matar os patriotas. Se não se põe fim a isto, a China perecerá às mãos da reação. Trata-se, por consequência, duma questão que respeita a todo o país, uma questão de alta importância. Nós devemos exigir que o Governo Nacional castigue esses reacionários com o máximo rigor.

Os camaradas devem dar-se igualmente conta de que, recentemente, as provocações do imperialismo japonês intensificaram-se, assim como se intensificou a ajuda que o imperialismo internacional dispensa ao Japão.(3) Simultaneamente, os traidores no interior da China, os Uam Tsim-vei declarados e camuflados, empenham-se mais ativamente do que nunca na sabotagem da resistência anti-japonesa, na sabotagem da união, em fazer-nos marchar para trás. Procuram conduzir a maioria da China a capitulação, provocam divisões internas, a guerra civil. Sob a designação de “medidas para limitação da atividade dos partidos heréticos”(4), circulam atualmente umas instruções secretas que são medidas de todo reacionárias que ajudam o imperialismo japonês e prejudicam a resistência, a união e o progresso. Mas quem são os “heréticos”? São os imperialistas japoneses, é Uam Tsim-vei, são os traidores. Acaso poderão qualificar-se de “heréticos” o Partido Comunista e os demais partidos e grupos políticos anti-japoneses que se unem no combate ao agressor japonês? No entanto, há capitulacionistas, reacionários e obstinados que não hesitam em provocar fricções e divisão entre as fileiras anti-japonesas. Serão tais atividades justificáveis? De modo nenhum! (Aplausos em toda a sala.) A quem pois se torna necessário impor essa “limitação”? Aos imperialistas japoneses, a Uam Tsim-vei, aos reacionários e aos capitulacionistas. (Aplausos em toda a sala.) Por que motivo se limitará então o Partido Comunista, que resiste ao Japão com um máximo de firmeza e é o mais revolucionário e o mais progressista de todos os partidos? Por pura aberração. Nós, população de Ien-an, opomo-nos resolutamente e levantamos um protesto enérgico contra isso.(Aplausos em toda a sala.) Devemos opor-nos as “medidas para limitação da atividade dos partidos heréticos”, fonte de toda a espécie de comportamentos criminosos destruidores da união. O comício de hoje, realizamo-lo para vincar a nossa vontade de prosseguir na resistência, na união e no progresso. Para isso, as “medidas para limitação da atividade dos partidos heréticos” devem ser suprimidas, os capitulacionistas e os reacionários devem ser castigados, a proteção assegurada a todos os camaradas empenhados na revolução, aos camaradas e ao povo que se batem na resistência a agressão japonesa. (Aplausos retumbantes, palavras de ordem ressoam pela sala.)

Notas de rodapé:

(1) No dia 12 de Junho de 1939, sob ordens secretas de Tchiang Kai-chek, tropas do XXVII Grupo de Exércitos do Kuomintang cercaram o Birô de Ligação instalado pelo Novo IV Exército em Pinquiam, província de Hunan, e assassinaram a sangue frio os camaradas Tou Djem-cuen, oficial do Estado Maior do Novo IV Exército, Luo Tse-mim, ajudante-major do VIII Exército, e mais quatro outros. Esse incidente sangrento provocou a indignação das populações das bases democráticas anti-japonesas bem como a de todos os indivíduos honestos das regiões controladas pelo Kuomintang. O incidente sangrento foi provocado por ordem de Tchiang Kai-chek e seus acólitos. Os reacionários que o camarada Mao Tsetung condenou no discurso eram precisamente Tchiang Kai-chek e seus cúmplices. (retornar ao texto)

(2) Ao explicar aqui o significado da palavra “unificação”, o camarada Mao Tsetung tinha em vista os desejos escondidos dos reacionários do Kuomintang que, sob pretexto de “unificação”, tentavam eliminar as forças armadas e as bases de apoio anti-japonesas dirigidas pelo Partido Comunista, depois do restabelecimento da cooperação entre oKuomintang e o Partido Comunista para a luta comum contra o invasor japonês, o Kuomintang utilizou a palavra de ordem de “unificação” como arma principal para atacar o Partido Comunista, acusando-o de pretensão de originalidade, obstrução da unificação e ação contrária aos interesses da resistência ao Japão. Os reacionários fizeram ecoar mais fortemente os seus clamores depois que a Quinta Sessão Plenária do Comité Executivo Central eleito pelo V Congresso Nacional do Kuomintang adotou, em Janeiro de 1939, as “medidas para limitação da atividade dos partidos heréticos”, propostas por Tchiang Kai-chek. No seu discurso, o camarada Mao Tsetung arrancou essa palavra de ordem, “unificação”, aos reacionários do Kuomintang e converteu-a numa palavra de ordem revolucionária para combater as ações divisionistas do Kuomintang contra o povo e contra a nação. (retornar ao texto)

(3) Ver Mao Tsetung, “Contra as atividades Capitulacionistas”. Após a queda de Vuhan, em Outubro de 1938, os agressores japoneses procuraram sobretudo seduzir oKuomintang através de meios políticos, para levá-lo a capitular; o imperialismo internacional, em particular os imperialistas ingleses e norte-americanos, não cessava aliás de propor a Tchiang Kai-chek o entabulamento de negociações de paz, e o inglês Chamberlain deu a entender que o seu país participaria na “reconstrução do Extremo Oriente”. Em 1939, os agressores japoneses e o imperialismo internacional multiplicaram as intrigas. No mês de Abril do mesmo ano, o embaixador da Inglaterra na China, Clark-Kerr, passou a um vaivém entre Tchiang Kai-chek e os japoneses, esforçando-se por levá-los a negociar a paz. Em Julho concluiu-se um acordo anglo-nipónico, no qual o governo inglês se comprometia a reconhecer plenamente “a situação de fato” criada na China pelo ocupante japonês. (retornar ao texto)

(4) Postas secretamente em vigor pelo Comité Executivo Central do Kuomintang, em 1939, essas medidas impunham ao Partido Comunista e a todos os progressistas uma severa limitação da sua liberdade de pensamento, expressão e ação no intuito de sabotarem as organizações populares anti-japonesas. Elas estipulavam que nas regiões onde, segundo o Kuomintang, a “atividade do Partido Comunista é mais intensa” aplicar-se-ia um “sistema de caução solidária”, ao mesmo tempo que se criava por toda a parte, na organização dos pao e dos tsia, uma “rede de informações”, isto é, um organismo dos serviços secretos contra-revolucionários, para vigiar e restringir as atividades do povo em todos os momentos. (retornar ao texto)



Fonte: MIA

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Facebook: o fim está próximo?


Com fuga de usuários jovens, plataforma envelhece. Estudo prevê declínio semelhante ao das epidemias. Não estará na hora de uma rede mais livre?
Por Gabriela Leite
O quanto o Facebook já faz parte de nossas vidas, e por quanto tempo isso ainda vai durar? Há grandes chances de você ter chegado até este texto ou ter conhecido este site através da rede social de Mark Zuckeberg — que já é utilizada por mais de um bilhão de pessoas. Mas antes dela, houve outras: o Orkut, famoso principalmente entre os brasileiros, o MySpace, mais comum nos EUA e diversas outras, mais segmentadas ou não. Com base na vida e morte destes sites populares na internet, algumas pesquisas começam a tentar prever quando será o fim do novo gigante das redes sociais, cuja ética parece cada vez mais questionável.
Alguns fatos concretos indicam que, sob algumas perspectivas, o Facebook já está caindo: desde 2011, 25,3% dos adolescentes de 13 a 17 anos desativaram suas contas apenas nos Estados Unidos. Isso fez a rede envelhecer sensivelmente: hoje, também nos EUA, a faixa etária com mais usuários é entre 35 e 54 anos — e a de mais de 55 é a que mais cresce. O motivo para os jovens  abandonarem a rede é exatamente este: a necessidade de privacidade em relação aos adultos, que, uma vez integrados à plataforma, podem “vigiar” seus filhos e parentes. Por isso, estes migram para redes sociais mais específicas, de compartilhamento de fotos e imagens, por exemplo.
Outra previsão sombria (e curiosa) sobre o futuro do “Face” partiu de dois cientistas da Universidade de Princeton — John Cannarella e Joshua Spechler. Eles compararam a ascensão e declínio da rede mais popular do planeta a uma similar, hoje esquecida (o MySpace) e a outro fenômeno humano relacionado a contágio: a expansão e posterior recuo das doenças infecciosas… Ao fazê-lo, chegaram ao gráfico abaixo (a curva de popularidade do Facebook foi construída em função de número de buscas pela rede no Google). Sua conclusão é: a rede de Zuckenberg já atingiu seu pico e começou a recuar; é provável que perca 80% de seus atuais usuários entre 2015 e 2017.
Mas há quem seja mais cético, diante das teorias catastrofistas. Para o site de tecnologia TechVibes, o Facebook é grande demais para cair num futuro próximo. Segundo eles, por mais que haja uma queda em seus usuários, economicamente falando, a empresa continua a crescer. Estima-se que sua receita para 2013 tenha sido de 7 bilhões de dólares, o que significa um crescimento de 50% a cada ano. Com tanto poder, afirmam, Zuckeberg pode facilmente comprar qualquer nova iniciativa que ponha em risco seu reinado. Pensa que estagnação do número de buscas pelo Facebook não é relevante — ele teria se tornado tão popular que já não é preciso procurá-lo, assim como você nunca vai ouvir alguém falando “prove essa bebida, Coca Cola, é uma delícia!”. O “Face” não estaria ameaçado de morte por já fazer parte do dia-a-dia de um sétimo da população mundial — por isso, plenamente estabelecido em nossas vidas.
Apesar de fortemente presente e viciante, o Facebook é a rede que queremos para o mundo? Não são poucos os casos como o desta semana, em que os administradores do Facebook tiraram do ar uma página contra a Copa do Mundo, a “Operation World Cup”. Semanas atrás, haviam sumido com os eventos de “rolezinhos” em diversos shoppings do Brasil. Durante os protestos de junho, conteúdos de revolta também desapareciam do dia para a noite. Em casos mais absurdos, a rede já tirou do ar obras de artistas como Gustave Courbet e ensaios de mulheres com seus bebês recém nascidos. Além disso, a rede sofreu diversas críticas por vender os dados de seus usuários para empresas. Em tempos de risco da liberdade da internet, uma rede menos mercadológica e mais livre viria a calhar.

domingo, 2 de fevereiro de 2014

A Batalha de Stalingrado

batalha de Stalingrado terminou em 2 de fevereiro de 1943 com a vitória dos comunistas e a derrota dos nazistas.  Marcou a virada na Segunda Guerra e é considerada a maior e mais sangrenta batalha de toda a História, causando a morte e ferimentos em cerca de dois milhões de soldados e civis.


A vitória em Stalingrado significou a derrota militar, psicológica e moral dos nazistas. Os invasores foram destroçados, “cozinhados no grande caldeirão de Stalingrado”. Sobre esse período, Stálin escreveu: “O estado moral do nosso exército é superior ao do exército alemão, pois ele defende a Pátria contra os usurpadores estrangeiros e acredita na justeza da própria causa, ao passo que o exército alemão conduz uma guerra espoliadora e pilha o país alheio, não tendo a possibilidade de acreditar, por um minuto sequer, na justeza de sua obra infame”.
A partir de Stalingrado, foram dadas as condições para que dezenas de outras cidades por toda a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) se libertassem do jugo do inimigo em 1943 e 1944, o que estabeleceu as condições para a expulsão definitiva dos invasores da grande pátria russa.
Com todos estes êxitos, a URSS preparou uma gigantesca contraofensiva para libertar, no início de 1945, os países do Leste Europeu, uma grande extensão geográfica que vai desde os países banhados pelo Mar Báltico (Dinamarca, Suécia, Finlândia, Estônia, Letônia, Lituânia, Polônia e Alemanha) até a região dos Cárpatos (República Tcheca, Eslováquia, Polônia, Romênia e Ucrânia). Um importante fator para essa nova vitória sobre os nazistas foi o enorme apoio recebido pelo Exército Vermelho dos povos oprimidos, em particular dos combatentes dos partidos comunistas. Após a libertação desses países, estabeleceram-se as condições para que a URSS voltasse suas energias para a derrota final do nazifascismo.
A Igreja e o Governo Soviético
Ao contrário do que diz a raivosa burguesia sobre a suposta perseguição dos comunistas soviéticos à religião, a Igreja apoiou o Governo Soviético contra os nazistas.  Frequentemente, os padres, em suas celebrações, faziam comparação dos nazistas com os “Cavaleiros Teutônicos” que foram derrotados em 1242, na planície gelada do lago Peipus, por Santo Alexandre Nevsky, patrono de Leningrado.
Apenas em algumas cidades ocupadas, os padres aderiram aos nazistas, mas, no geral, a Igreja Ortodoxa esteve ao lado do Governo Soviético, convocando seus fiéis a não trair a pátria e seus sacerdotes a “partilhar as provações e sofrimentos do povo russo”. Essa ajuda não se deu somente com palavras; além de orações, a Igreja coletava donativos para o Exército Vermelho, chegando  em Gorki a ter “recolhido um milhão de rublos para o Fundo de Defesa”, e os líderes da Igreja, após um grande trabalho de recolhimento de contribuições dos seus fiéis, “entregaram ao exército uma coluna de tanques batizada com o nome de Dimitri Donskoi (príncipe russo que derrotou os tártaros no campo de Kulikovo, em 1380)”. Por essa posição, muitos padres foram perseguidos pelos nazistas na Sérvia, Bulgária, Romênia e outros países.
Para o Partido Bolchevique e o Governo, essa aliança com a Igreja, que já vinha desde a Constituição de 1936, que garantia plena liberdade religiosa, foi também de grande importância para neutralizar os setores ainda duvidosos dos países aliados. Foi garantida a reabertura de seminários e academias teológicas e criado o Conselho para Assuntos da Igreja Ortodoxa Russa, que emitia licença para abertura e restauração de igrejas e demais assuntos referentes à religião. Isso tudo, no entanto, não significou, de forma alguma, uma volta ao passado, pois não houve reunificação do Estado com a Igreja, e esta não mais servia à exploração como fazia no regime czarista.
Na reunião dos países aliados (URSS, EUA e Inglaterra), também conhecida como Conferência de Yalta (¹), que ocorreu de 4 a 11 de fevereiro de 1945, Stálin, Molotov e os demais representantes soviéticos apresentaram o plano da tomada de Berlim. O primeiro-ministro inglês Winston Churchill e o presidente dos EUA Franklin Roosevelt, movidos pelos seus interesses econômicos e principalmente pelo receio da chegada da URSS sozinha a Berlim, propuseram que a União Soviética esperasse para que todos “juntos” chegassem à capital alemã. “Se entrarmos todos juntos, seria ótimo para a ideia das Nações Unidas”, argumentou Churchill. Nesse momento, a URSS estava a 70 km de Berlim. Stálin rejeita categoricamente a prorrogação da guerra, como na prática sugeriam os lideres imperialistas. “Se os aliados estiverem adequadamente ativos no Ocidente, estou certo de que todos estamos às vésperas da Batalha de Berlim. (…) As pessoas querem paz. Nós podemos e devemos dar-lhes a paz o quanto antes”, disse Stálin. Mesmo contra a vontade, os líderes de EUA e Inglaterra são obrigados a aceitar o acordo proposto pela URSS.
A Segunda Frente
Os chamados países aliados, EUA e Inglaterra, adiaram o quanto puderam a ajuda concreta à URSS (que estava combatendo do lado oriental). Seu objetivo era desencadear uma segunda frente de guerra (do lado ocidental) contra a Alemanha, esperando que os soviéticos fossem derrotados pelos nazistas. Vendo a impossibilidade de seu desejo se tornar realidade e temendo que a URSS derrotasse sozinha os nazifascistas, apenas em 6 de junho de 1944 foi desencadeada a Segunda Frente.
Este evento é conhecido na história como o desembarque na Normandia ou “Dia D”. Geralmente é apresentado em inúmeros livros, revistas e filmes estadunidenses como o dia determinante que garantiu a virada definitiva da guerra. Embora tenha sido importante o famoso Dia D, as forças centrais do exército nazista já haviam sido derrotadas pela URSS, que se encontrava em plena marcha para Alemanha, empurrando de volta a Berlim o que havia restado das tropas nazistas.
A ofensiva final
As condições que vinham sendo gestadas desde 1943 estavam suficientemente amadurecidas. Era chegada a hora da ofensiva final. O Exército Vermelho penetra em território alemão com a orientação de aniquilar de vez o inimigo. Chega a Berlim com uma força imensa, e essa grande e última batalha é travada de abril a maio de 1945 em Berlim.
Impotentes diante do colossal ataque soviético, com bombardeios constantes, tanques, artilharia pesada e milhões de soldados, alguns dos principais chefes nazistas, entre eles o principal, Adolf Hitler, em meio à derrota final do Terceiro Reich (como se denominou então seu governo) cometeu suicídio.
Poucos dias depois, ocorre a histórica tomada do Reichstag (o Parlamento alemão), onde um grupo de soldados soviéticos foi destacado para atingir o ponto mais alto do prédio e o fez, fincando ali a bandeira vermelha. O mesmo local que, em 1933, Hitler incendiara e desavergonhadamente acusara os comunistas de tê-lo feito. Esse ato decretou a derrota final da Alemanha nazista, que, alguns dias depois, assinava sua rendição incondicional à URSS.
Nenhum outro país teve maiores perdas materiais e espirituais que a URSS na Segunda Guerra. “Somente nos campos de concentração nazistas foram mortos mais de 3 milhões e 200 mil soviéticos e no total cerca de 23 milhões de pessoas morreram na luta contra o nazifascismo”, afirma o escritor  Ludo Martens emStálin, um novo olhar.
Leonardo Péricles, Belo Horizonte 
Notas:
¹ Conferência de Yalta – A Conferência de Yalta foi a realização de um conjunto de reuniões ocorridas entre 4 e 11 de fevereiro de 1945 no Palácio Livadia, na estação balneária de Yalta,  às margens do Mar Negro, na Crimeia. Foi a segunda das três conferências em tempo de guerra entre os líderes das principais nações aliadas (a anterior ocorreu em Teerã, e a posterior em Potsdam). Os chefes de Estado dos Estados Unidos da América e da União Soviética e o primeiro-ministro do Reino Unido reuniram-se em segredo em Yalta para decidir o fim da Segunda Guerra Mundial.
Bibliografia:
A Grande Conspiração – A Guerra Secreta contra a Rússia Soviética – Michael Sayers e Albert E. Kahn, 6ª edição, Editora Brasiliense, São Paulo, 1959.
Stálin – Um novo olhar – Ludo Martens, Editora Revan, Rio de Janeiro, 2003.
Stálin – História crítica de uma lenda negra – Domenico Losurdo, Editora Revan, Rio de Janeiro, 2010.
O grande feito do povo soviético e do seu exército – Vassíli Riábov, Edições Progresso, Moscou, 1983 (Riábov foi oficial e da imprensa, a partir de 1950, do Exército Vermelho)
A Rússia na Guerra 1941 – 1945 – Alexander Werth – vol. 1 – Civilização Brasileira, 1966.
Stalingrado,1942 – Claudio Lucchesi – 1ª edição, CeR Editorial, São Paulo, 2009.
Europa na guerra, uma vitória nada simples – Norman Davies, Editora Record, 2009
Filme – Do Inglês  Fall of Berlin: The Restored Soviet WW 2 Epic (A queda de Berlim). Produção soviética, de Mikhail Chiaureli , 1949. Legendado em português por Glauber Ataíde. Edições CCML 2011.


Fonte: A Verdade 



Stalingrado - Carlos Drummond de Andrade


Depois de Madri e de Londres, ainda há grandes cidades!
O mundo não acabou, pois que entre as ruínas 
outros homens surgem, a face negra de pó e de pólvora, 
e o hálito selvagem da liberdade 
dilata os seus peitos, Stalingrado,
seus peitos que estalam e caem, 
enquanto outros, vingadores, se elevam.

A poesia fugiu dos livros, agora está nos jornais.
Os telegramas de Moscou repetem Homero.
Mas Homero é velho. Os telegramas cantam um mundo novo
que nós, na escuridão, ignorávamos.
Fomos encontrá-lo em ti, cidade destruída, 
na paz de tuas ruas mortas mas não conformadas,
no teu arquejo de vida mais forte que o estouro das bombas, 
na tua fria vontade de resistir.

Saber que resistes.
Que enquanto dormimos, comemos e trabalhamos, resistes.
Que quando abrimos o jornal pela manhã teu nome (em ouro oculto) estará firme no alto da página.
Terá custado milhares de homens, tanques e aviões, mas valeu a pena.
Saber que vigias, Stalingrado,
sobre nossas cabeças, nossas prevenções e nossos confusos pensamentos distantes
dá um enorme alento à alma desesperada
e ao coração que duvida. 

Stalingrado, miserável monte de escombros, entretanto resplandecente!
As belas cidades do mundo contemplam-te em pasmo e silêncio.
Débeis em face do teu pavoroso poder, 
mesquinhas no seu esplendor de mármores salvos e rios não profanados,
as pobres e prudentes cidades, outrora gloriosas, entregues sem luta, 
aprendem contigo o gesto de fogo.
Também elas podem esperar.

Stalingrado, quantas esperanças!
Que flores, que cristais e músicas o teu nome nos derrama!
Que felicidade brota de tuas casas!
De umas apenas resta a escada cheia de corpos; 
de outras o cano de gás, a torneira, uma bacia de criança.
Não há mais livros para ler nem teatros funcionando nem trabalho nas fábricas, 
todos morreram, estropiaram-se, os últimos defendem pedaços negros de parede,
mas a vida em ti é prodigiosa e pulula como insetos ao sol,
ó minha louca Stalingrado!

A tamanha distância procuro, indago, cheiro destroços sangrentos,
apalpo as formas desmanteladas de teu corpo,
caminho solitariamente em tuas ruas onde há mãos soltas e relógios partidos,
sinto-te como uma criatura humana, e que és tu, Stalingrado, senão isto?
Uma criatura que não quer morrer e combate, 
contra o céu, a água, o metal, a criatura combate,
contra milhões de braços e engenhos mecânicos a criatura combate,
contra o frio, a fome, a noite, contra a morte a criatura combate, 
e vence.

As cidades podem vencer, Stalingrado!
Penso na vitória das cidades, que por enquanto é apenas uma fumaça subindo do Volga.
Penso no colar de cidades, que se amarão e se defenderão contra tudo.
Em teu chão calcinado onde apodrecem cadáveres, 
a grande Cidade de amanhã erguerá a sua Ordem.


Do livro Rosa do Povo (1945). In Carlos Drummond de Andrade. Poesia e Prosa. Rio de janeiro, Editora Nova Aguilar, 1983