A batalha de Stalingrado terminou em 2 de fevereiro de 1943 com a vitória dos comunistas e a derrota dos nazistas. Marcou a virada na Segunda Guerra e é considerada a maior e mais sangrenta batalha de toda a História, causando a morte e ferimentos em cerca de dois milhões de soldados e civis.
A vitória em Stalingrado significou a derrota militar, psicológica e moral dos nazistas. Os invasores foram destroçados, “cozinhados no grande caldeirão de Stalingrado”. Sobre esse período, Stálin escreveu: “O estado moral do nosso exército é superior ao do exército alemão, pois ele defende a Pátria contra os usurpadores estrangeiros e acredita na justeza da própria causa, ao passo que o exército alemão conduz uma guerra espoliadora e pilha o país alheio, não tendo a possibilidade de acreditar, por um minuto sequer, na justeza de sua obra infame”.
A partir de Stalingrado, foram dadas as condições para que dezenas de outras cidades por toda a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) se libertassem do jugo do inimigo em 1943 e 1944, o que estabeleceu as condições para a expulsão definitiva dos invasores da grande pátria russa.
Com todos estes êxitos, a URSS preparou uma gigantesca contraofensiva para libertar, no início de 1945, os países do Leste Europeu, uma grande extensão geográfica que vai desde os países banhados pelo Mar Báltico (Dinamarca, Suécia, Finlândia, Estônia, Letônia, Lituânia, Polônia e Alemanha) até a região dos Cárpatos (República Tcheca, Eslováquia, Polônia, Romênia e Ucrânia). Um importante fator para essa nova vitória sobre os nazistas foi o enorme apoio recebido pelo Exército Vermelho dos povos oprimidos, em particular dos combatentes dos partidos comunistas. Após a libertação desses países, estabeleceram-se as condições para que a URSS voltasse suas energias para a derrota final do nazifascismo.
A Igreja e o Governo Soviético
Ao contrário do que diz a raivosa burguesia sobre a suposta perseguição dos comunistas soviéticos à religião, a Igreja apoiou o Governo Soviético contra os nazistas. Frequentemente, os padres, em suas celebrações, faziam comparação dos nazistas com os “Cavaleiros Teutônicos” que foram derrotados em 1242, na planície gelada do lago Peipus, por Santo Alexandre Nevsky, patrono de Leningrado.
Apenas em algumas cidades ocupadas, os padres aderiram aos nazistas, mas, no geral, a Igreja Ortodoxa esteve ao lado do Governo Soviético, convocando seus fiéis a não trair a pátria e seus sacerdotes a “partilhar as provações e sofrimentos do povo russo”. Essa ajuda não se deu somente com palavras; além de orações, a Igreja coletava donativos para o Exército Vermelho, chegando em Gorki a ter “recolhido um milhão de rublos para o Fundo de Defesa”, e os líderes da Igreja, após um grande trabalho de recolhimento de contribuições dos seus fiéis, “entregaram ao exército uma coluna de tanques batizada com o nome de Dimitri Donskoi (príncipe russo que derrotou os tártaros no campo de Kulikovo, em 1380)”. Por essa posição, muitos padres foram perseguidos pelos nazistas na Sérvia, Bulgária, Romênia e outros países.
Para o Partido Bolchevique e o Governo, essa aliança com a Igreja, que já vinha desde a Constituição de 1936, que garantia plena liberdade religiosa, foi também de grande importância para neutralizar os setores ainda duvidosos dos países aliados. Foi garantida a reabertura de seminários e academias teológicas e criado o Conselho para Assuntos da Igreja Ortodoxa Russa, que emitia licença para abertura e restauração de igrejas e demais assuntos referentes à religião. Isso tudo, no entanto, não significou, de forma alguma, uma volta ao passado, pois não houve reunificação do Estado com a Igreja, e esta não mais servia à exploração como fazia no regime czarista.
Na reunião dos países aliados (URSS, EUA e Inglaterra), também conhecida como Conferência de Yalta (¹), que ocorreu de 4 a 11 de fevereiro de 1945, Stálin, Molotov e os demais representantes soviéticos apresentaram o plano da tomada de Berlim. O primeiro-ministro inglês Winston Churchill e o presidente dos EUA Franklin Roosevelt, movidos pelos seus interesses econômicos e principalmente pelo receio da chegada da URSS sozinha a Berlim, propuseram que a União Soviética esperasse para que todos “juntos” chegassem à capital alemã. “Se entrarmos todos juntos, seria ótimo para a ideia das Nações Unidas”, argumentou Churchill. Nesse momento, a URSS estava a 70 km de Berlim. Stálin rejeita categoricamente a prorrogação da guerra, como na prática sugeriam os lideres imperialistas. “Se os aliados estiverem adequadamente ativos no Ocidente, estou certo de que todos estamos às vésperas da Batalha de Berlim. (…) As pessoas querem paz. Nós podemos e devemos dar-lhes a paz o quanto antes”, disse Stálin. Mesmo contra a vontade, os líderes de EUA e Inglaterra são obrigados a aceitar o acordo proposto pela URSS.
A Segunda Frente
Os chamados países aliados, EUA e Inglaterra, adiaram o quanto puderam a ajuda concreta à URSS (que estava combatendo do lado oriental). Seu objetivo era desencadear uma segunda frente de guerra (do lado ocidental) contra a Alemanha, esperando que os soviéticos fossem derrotados pelos nazistas. Vendo a impossibilidade de seu desejo se tornar realidade e temendo que a URSS derrotasse sozinha os nazifascistas, apenas em 6 de junho de 1944 foi desencadeada a Segunda Frente.
Este evento é conhecido na história como o desembarque na Normandia ou “Dia D”. Geralmente é apresentado em inúmeros livros, revistas e filmes estadunidenses como o dia determinante que garantiu a virada definitiva da guerra. Embora tenha sido importante o famoso Dia D, as forças centrais do exército nazista já haviam sido derrotadas pela URSS, que se encontrava em plena marcha para Alemanha, empurrando de volta a Berlim o que havia restado das tropas nazistas.
A ofensiva final
As condições que vinham sendo gestadas desde 1943 estavam suficientemente amadurecidas. Era chegada a hora da ofensiva final. O Exército Vermelho penetra em território alemão com a orientação de aniquilar de vez o inimigo. Chega a Berlim com uma força imensa, e essa grande e última batalha é travada de abril a maio de 1945 em Berlim.
Impotentes diante do colossal ataque soviético, com bombardeios constantes, tanques, artilharia pesada e milhões de soldados, alguns dos principais chefes nazistas, entre eles o principal, Adolf Hitler, em meio à derrota final do Terceiro Reich (como se denominou então seu governo) cometeu suicídio.
Poucos dias depois, ocorre a histórica tomada do Reichstag (o Parlamento alemão), onde um grupo de soldados soviéticos foi destacado para atingir o ponto mais alto do prédio e o fez, fincando ali a bandeira vermelha. O mesmo local que, em 1933, Hitler incendiara e desavergonhadamente acusara os comunistas de tê-lo feito. Esse ato decretou a derrota final da Alemanha nazista, que, alguns dias depois, assinava sua rendição incondicional à URSS.
Nenhum outro país teve maiores perdas materiais e espirituais que a URSS na Segunda Guerra. “Somente nos campos de concentração nazistas foram mortos mais de 3 milhões e 200 mil soviéticos e no total cerca de 23 milhões de pessoas morreram na luta contra o nazifascismo”, afirma o escritor Ludo Martens emStálin, um novo olhar.
Leonardo Péricles, Belo Horizonte
Notas:¹ Conferência de Yalta – A Conferência de Yalta foi a realização de um conjunto de reuniões ocorridas entre 4 e 11 de fevereiro de 1945 no Palácio Livadia, na estação balneária de Yalta, às margens do Mar Negro, na Crimeia. Foi a segunda das três conferências em tempo de guerra entre os líderes das principais nações aliadas (a anterior ocorreu em Teerã, e a posterior em Potsdam). Os chefes de Estado dos Estados Unidos da América e da União Soviética e o primeiro-ministro do Reino Unido reuniram-se em segredo em Yalta para decidir o fim da Segunda Guerra Mundial.Bibliografia:A Grande Conspiração – A Guerra Secreta contra a Rússia Soviética – Michael Sayers e Albert E. Kahn, 6ª edição, Editora Brasiliense, São Paulo, 1959.Stálin – Um novo olhar – Ludo Martens, Editora Revan, Rio de Janeiro, 2003.Stálin – História crítica de uma lenda negra – Domenico Losurdo, Editora Revan, Rio de Janeiro, 2010.O grande feito do povo soviético e do seu exército – Vassíli Riábov, Edições Progresso, Moscou, 1983 (Riábov foi oficial e da imprensa, a partir de 1950, do Exército Vermelho)A Rússia na Guerra 1941 – 1945 – Alexander Werth – vol. 1 – Civilização Brasileira, 1966.Stalingrado,1942 – Claudio Lucchesi – 1ª edição, CeR Editorial, São Paulo, 2009.Europa na guerra, uma vitória nada simples – Norman Davies, Editora Record, 2009Filme – Do Inglês Fall of Berlin: The Restored Soviet WW 2 Epic (A queda de Berlim). Produção soviética, de Mikhail Chiaureli , 1949. Legendado em português por Glauber Ataíde. Edições CCML 2011.
Fonte: A Verdade
Stalingrado - Carlos Drummond de Andrade
Depois de Madri e de Londres, ainda há grandes cidades!
O mundo não acabou, pois que entre as ruínas
outros homens surgem, a face negra de pó e de pólvora,
e o hálito selvagem da liberdade
dilata os seus peitos, Stalingrado,
seus peitos que estalam e caem,
enquanto outros, vingadores, se elevam.
A poesia fugiu dos livros, agora está nos jornais.
Os telegramas de Moscou repetem Homero.
Mas Homero é velho. Os telegramas cantam um mundo novo
que nós, na escuridão, ignorávamos.
Fomos encontrá-lo em ti, cidade destruída,
na paz de tuas ruas mortas mas não conformadas,
no teu arquejo de vida mais forte que o estouro das bombas,
na tua fria vontade de resistir.
Saber que resistes.
Que enquanto dormimos, comemos e trabalhamos, resistes.
Que quando abrimos o jornal pela manhã teu nome (em ouro oculto) estará firme no alto da página.
Terá custado milhares de homens, tanques e aviões, mas valeu a pena.
Saber que vigias, Stalingrado,
sobre nossas cabeças, nossas prevenções e nossos confusos pensamentos distantes
dá um enorme alento à alma desesperada
e ao coração que duvida.
Stalingrado, miserável monte de escombros, entretanto resplandecente!
As belas cidades do mundo contemplam-te em pasmo e silêncio.
Débeis em face do teu pavoroso poder,
mesquinhas no seu esplendor de mármores salvos e rios não profanados,
as pobres e prudentes cidades, outrora gloriosas, entregues sem luta,
aprendem contigo o gesto de fogo.
Também elas podem esperar.
Stalingrado, quantas esperanças!
Que flores, que cristais e músicas o teu nome nos derrama!
Que felicidade brota de tuas casas!
De umas apenas resta a escada cheia de corpos;
de outras o cano de gás, a torneira, uma bacia de criança.
Não há mais livros para ler nem teatros funcionando nem trabalho nas fábricas,
todos morreram, estropiaram-se, os últimos defendem pedaços negros de parede,
mas a vida em ti é prodigiosa e pulula como insetos ao sol,
ó minha louca Stalingrado!
A tamanha distância procuro, indago, cheiro destroços sangrentos,
apalpo as formas desmanteladas de teu corpo,
caminho solitariamente em tuas ruas onde há mãos soltas e relógios partidos,
sinto-te como uma criatura humana, e que és tu, Stalingrado, senão isto?
Uma criatura que não quer morrer e combate,
contra o céu, a água, o metal, a criatura combate,
contra milhões de braços e engenhos mecânicos a criatura combate,
contra o frio, a fome, a noite, contra a morte a criatura combate,
e vence.
As cidades podem vencer, Stalingrado!
Penso na vitória das cidades, que por enquanto é apenas uma fumaça subindo do Volga.
Penso no colar de cidades, que se amarão e se defenderão contra tudo.
Em teu chão calcinado onde apodrecem cadáveres,
a grande Cidade de amanhã erguerá a sua Ordem.
Do livro Rosa do Povo (1945). In Carlos Drummond de Andrade. Poesia e Prosa. Rio de janeiro, Editora Nova Aguilar, 1983
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