quarta-feira, 21 de março de 2012

O MMA sem preconceitos

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Por que passei a acompanhar esportes de combate e pensar que podem ajudar a entender nossa cultura e organização social
Por Marília Moschkovich, editora de Mulher Alternativa
Nunca pratiquei uma luta, nem estudei a fundo a sociologia do esporte. Ressalto aos leitores, portanto, que minha opinião é a de uma espectadora que por acaso é também socióloga. Até o início de 2010, esta espectadora socióloga que aqui escreve não havia tido maiores contatos com esportes de combate. Em meu preconceito, à época, este tipo de esporte era uma violência, uma selvageria – características que em minha ignorância eu também associava ao público das lutas.
Comecei a namorar meu atual marido, que de violento e selvagem não tem nada (muito pelo contrário, aliás, é uma pessoa “civilizada”, gentil, divertida) e meu preconceito caiu por terra: ele é e já era havia muitos anos, quando o conheci, fã incondicional de Mixed Martial Arts (MMA ou ainda Artes Marciais Mistas). Aos poucos, fui sendo apresentada às regras do esporte, a suas medidas técnicas de segurança, a sua história. Hoje assistimos em casa, pela internet ou em bares aos grandes eventos de MMA televisionados, como é o caso do famoso Ultimate Fighting Championship (UFC).
Preconceito é, no sentido literal, um conceito ou opinião definidos antes de se tomar conhecimento real de alguma cosia. Logo, conhecer o MMA é um passo fundamental para que nossas opiniões e o debate público em torno deste controverso esporte passem de meros preconceitos a um diálogo que pode nos ajudar a entender muito, inclusive, de nossa própria cultura e organização social. A quem interessar possa, descrevi bastante sobre esse processo de aprendizado e quebra dos meus próprios preconceitos com este que se tornou meu esporte favorito, enquanto espectadora (leia aqui). Talvez a reflexão seja útil a quem desejar questionar os próprios pontos de vista.
Preconceito é também o que norteia o projeto de lei de José Mentor (PT-SP), que ele defende com argumentos como este: “No Brasil, rinhas de galo e de canário são proibidas legalmente. Há cidades como São Paulo, por exemplo, que não permitem rodeios, porque ferem e machucam animais. Mas lutar MMA que maltrata, fere, machuca, lesiona, sangra o ser humano, pode! Rinha humana pode!” (leia o texto completo do deputado federal “>aqui), respondo na lata: depende da intensidade da prática. Como qualquer esporte. Por que não nos perguntamos se futebol é esporte para crianças, uma vez que sequencialmente assistimos jogadores lesionados gravemente e até mortes em campo? Simples. Porque sabemos que a prática nas escolinhas de futebol (ou em algumas delas, devo dizer) não é de alto rendimento. Não tem a mesma intensidade de treino exigida em times profissionais. Ora, no MMA pode valer o mesmo.
O famoso lutador Vitor Belfort chegou a comparar os esportes, também buscando desmistificar a ideia de que o MMA seria especialmente violento: “O que eu faço não é violento porque tem regra. Pode ser agressivo. Mas é agressivo você pilotar um carro a 300 quilômetros por hora ou andar em cima de uma bicicleta a 100. O futebol é mais violento que o MMA. O futebol americano, o hóquei, o rugby, o ciclismo, todos esses são mais violentos. Se você procurar a definição de violência no dicionário, vai ver que é algo como ‘empregar força física contra alguém ou intimidar moralmente com crueldade’. Violência é um ato infringido contra o outro sem regra” (leia o texto completo aqui).
Poderia-se argumentar, por outro lado, que a exposição à violência, ainda que regulamentada, interferiria negativamente no desenvolvimento de crianças e adolescentes e incentivaria até adultos a praticarem este tipo de ato. Ora, mesmo se o MMA for considerado violento, ele não é nem de longe a primeira e muito menos a pior cena de violência a que estamos expostos todos os dias. Seja na televisão, no cinema, nos videogames ou nas ruas. Violência é um homossexual espancado por mês na Paulista. Uma ciclista atropelada brutalmente. A polícia jogando bombas sobre uma favela cheia de crianças e civis. Espancando dependentes de crack no centro de São Paulo.
Mesmo com toda esta violência de fato, não nos tornamos mais violentos do que em outras épocas. Nem menos. A violência existe e é parte integrante de nossa sociedade. Se é necessária, não sei. Ela existe e está aí. Penso que seja nossa opção mais saudável tratá-la com as regras, disciplina e a ética de uma prática esportiva, ou com o imaginário simbólico de um videogame ou produção artística (peça de teatro, filme, literatura).

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