As grandes conquistas, criações e descobertas da humanidade foram
feitas por gente desobediente. Por isso, é tão chocante a explosão no
consumo de Ritalina
Por Nanda Barreto, em Transitiva e Direta | Imagem: Mariana Belém
Recebo com horror e indignação a pesquisa divulgada recentemente pela Anvisa que
mostra o aumento em 75% do consumo de Ritalina entre crianças e
adolescentes na faixa dos 6 aos 16 anos de 2009 a 2011.
Conhecida como a
“droga da obediência”, o medicamento é usado para combater o polêmico
Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade. Estamos drogando as
crianças em nome de uma sociedade doente.
Há tempos o clamor geral à obediência pulula
como pulga atrás da minha orelha esquerda. Obedecer é um mandamento
básico da educação. Ainda falamos gugu-dadá e mal caminhamos sobre os
dois pés quando começam a nos cobrar comportamentos obedientes. Qualquer
coisa diferente disso soa como má educação, um verdadeiro atentado à
vontade alheia. Para quem se “comporta”, recompensas. Para os
desobedientes, castigos.
Mas o que é “comportar-se bem” senão respeitar um conjunto de regras
que, muitas vezes, ninguém sabe exatamente a razão pela qual existem?
Quem determina o que e quem deve ser obedecido? E nem estou me rebelando
contra as “normas” de convivência social. Compreendo que a existência
de 7 bilhões de seres humanos dependa de um certo nível de organização,
direitos e deveres.
Estou falando da obediência como a via suprema da educação. A
obediência como um valor exacerbado que suprime o desenvolvimento,
atrofia o intelecto e acostuma o coração da gente a bater na freqüência
do medo. Bom, o fato é que essa pulga que planta bananeira atrás da
minha orelha também planta uma pergunta: se obedecer fosse realmente uma
virtude, será que a humanidade existiria?
Até onde posso alcançar, vejo que todas as grandes as conquistas,
criações e descobertas da humanidade foram feitas por gente
desobediente. Por gente que não se limitou a demarcações geográficas,
que amou desmedidamente e foi além do “possível”. Gente hiperativa que
soube dizer sim!, que soube dizer não!
Assim, fica difícil entender porque valorizamos tanto a obediência,
porque nos submetemos ao conformismo da inação e gastamos uma energia
gigantesca para satisfazer o senso-comum. Gente obediente não questiona,
não transforma, não reluz e não pisa na grama. Chatíssimo, né? Então,
que tal diminuirmos a Ritalina e semearmos a desobediência como uma
prática cotidiana para expandir ideias em lugar de reduzi-las ao velho e
equacionado binômio do “certo” e “errado”?
Fonte: Outras Palavras
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