terça-feira, 24 de julho de 2012

Marcelo Freixo: "PSOL fará uma campanha republicana no Rio"




Em entrevista à Carta Maior, o candidato do PSOL à prefeitura do Rio de Janeiro, Marcelo Freixo, fala sobre o sentido de sua candidatura e da disputa eleitoral deste ano. "A próxima prefeitura é a prefeitura de um calendário que há muito tempo não se tem na cidade, e de um nível de investimento muito grande mas também de contradições muito fortes. A concepção de cidade, a concepção de poder público que sair vitoriosa nesta eleição vai definir o Rio por muito tempo", defende.
Rio de Janeiro - Marcelo Freixo é um homem corajoso. Aos 45 anos, o professor de história perdeu a conta de quantas vezes desceu de helicóptero em pátios de presídios em rebelião para, escolhido pelos presos, negociar em frente ao pelotão armado de policiais uma saída para os conflitos nestes 25 anos de militância pelos direitos humanos.

Pelos direitos humanos sempre falou alto na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), primeiro em parceria com o mandato do atual deputado federal Chico Alencar (PSOL). A partir de 2007, em seu próprio mandato, quando propôs e presidiu a CPI das Milícias, que resultou no indiciamento de 225 envolvidos e na apresentação de 58 medidas contra as práticas criminosas, entre elas licitação do transporte alternativo e maior fiscalização da Agência Nacional de Petróleo (ANP) na distribuição de botijões de gás. A CPI ainda serviu de ajuda no roteiro do filme Tropa de Elite 2, que catapultou Freixo para a fama nacional ao inspirar o personagem Diogo Fraga, e ele mesmo aparecer em uma cena, assistindo uma aula de Fraga. 

Paga um preço alto por sua coragem. Não tem a suprema liberdade de andar sozinho até a próxima esquina. Mas jamais se queixou ou se fez de vítima pelo aparato de segurança que o cerca desde que convive com as constantes ameaças de morte. Hoje pede votos em todos os bairros da cidade como candidato à prefeitura pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL). E aposta em uma campanha ampla, com os diferentes setores da sociedade em suas instituições, nas ruas ou atrás das telas de computador se unindo para levá-lo ao segundo turno e ampliar o debate que ele se propõe a fazer.

Em entrevista exclusiva à Carta Maior ele fala dessa proposta e dos possíveis frutos dela, “do outro lado você tem 18 partidos aliados. Não há pessoa no mundo que consiga me convencer que esses 18 partidos têm um projeto de cidade. Tem projeto de cidade em uma aliança de 18 partidos? Não! Tem projeto de distribuição de cargos, fatiados no poder, e aí reproduz uma lógica de política que a sociedade está negando o tempo inteiro. Então se a gente quer negar, não adianta chegar no poder da mesma maneira. Tem que chegar de outra forma para fazer um governo diferente”, além do uso das redes sociais e do amadurecimento e chances do partido em outras capitais nestas eleições.

Carta Maior – Como está este início de campanha e quais os três principais pontos que o senhor pretende colocar em debate neste período?

Marcelo Freixo – A campanha está bem. É uma campanha militante, que cresce com um fôlego muito grande, que nasce de uma proposta de se repensar a forma de se fazer política no Rio de Janeiro visando um momento muito importante da história do Rio. A próxima prefeitura é a prefeitura de um calendário que há muito tempo não se tem na cidade, e de um nível de investimento muito grande mas também de contradições muito fortes.

Então a concepção de cidade, a concepção de poder público que sair vitoriosa nesta eleição vai definir o Rio por muito tempo. Se o Rio vai ser mais democrático, se vai ser menos democrático, se vai ser mais transparente, se não vai ser transparente. Como o poder público vai se relacionar com transporte, educação, saúde, saneamento... as questões essenciais de qualquer cidade. Tudo isso vai ser definido neste processo eleitoral.

E a gente entende que a nossa campanha coloca outra concepção do papel do poder público, uma outra visão de cidade, debate a cidade. Neste sentido a gente tem uma quantidade muito grande de militantes na rua, uma campanha muito participativa, uma campanha muito ousada, outra lógica política. A gente está querendo uma aliança, por exemplo, com a sociedade civil. As nossas alianças políticas não são através de cúpulas partidárias pensando no tempo de televisão e pensando na distribuição de cargos. Então aparentemente o PSOL é o único partido, mas tem o apoio do PCB, mas tem uma forte aliança com setores da sociedade civil. Intelectuais, artistas, estudantes, jovens, médicos, professores, funcionários públicos, essa sociedade está se organizando em comitês voluntários, em grupos de trabalho, está debatendo a cidade e está fazendo campanha, está indo para as ruas...

CM: Parece um início animador...

MF: Então essa maneira, essa outra pedagogia política que nasce no Rio de Janeiro é muito importante para a cidade, é uma contribuição que a gente está dando. A campanha nasce com esse espírito, inclusive com arrecadação. A gente aproveita o seu veículo de comunicação para fazer propaganda, quem quiser doar para a nossa arrecadação da campanha é muito bem vindo. Pode doar através do site da gente, que tem um mecanismo de doação eletrônica através da internet, que é o mais transparente, é o melhor, e é uma novidade também, isto não faz muito parte da nossa cultura política, essa doação.

CM: E os principais pontos que o senhor quer colocar em debate nesta campanha?

MF: Alguns pontos decisivos que você tem hoje. Hoje se você for pegar um tema fundamental, o que a população mais reclama é a saúde pública. A saúde, de longe, é o tema mais citado pela população como a principal deficiência do setor público.

Você hoje tem uma proposta, da atual gestão, do atual prefeito, que é da privatização da saúde, que é você construir muitos hospitais e muitas clínicas de família. Nós achamos que é importante a existência de clínicas de famílias, mas não do jeito que eles estão fazendo. Não na mão das OSs, não na mão das Organizações Sociais, que são empresas privadas. Constrói o prédio com dinheiro público, equipa com dinheiro público, mas quem administra esse dinheiro é a gestão privada sem a devida precaução com o dinheiro público, sem o devido cuidado, sem a devida legislação. Por exemplo, a lei de Licitação, a 8666, que é uma lei, enfim, que nem é das mais completas, das mais eficientes, mas é uma lei importante quando diz respeito à licitação, não precisa ser cumprida por uma OS, mesmo o dinheiro sendo público. Então você transformou, com isso, a saúde em um grande balcão de negócios, onde você tem muitos hospitais surgindo, mas não tem médico trabalhando.

CM: Por quê?

MF: Porque eles dobraram o orçamento da Saúde, de R$ 2 bilhões para R$ 4 bilhões, mas investiram na construção de hospital, investiram no custeio, no repasse da verba pública para a iniciativa privada, e não investiram nos médicos nem nos enfermeiros. Você hoje não tem profissionais atendendo. Você entra em um hospital, ele está limpo, tem TV de plasma, está bonito, mas não tem médico. Essa contradição da saúde a gente quer resolver.

Saiu um relatório, esse ano, do ministério da Saúde, que faz um ranking das capitais com atendimento ao SUS (Serviço Único de Saúde), atendimento da saúde pública. O Rio de Janeiro ficou em último lugar. Então o Rio está atrás de todas as outras capitais no que diz respeito à qualidade do atendimento à saúde pública. É inadmissível que uma cidade com o orçamento que tem o Rio, que é o segundo orçamento do Brasil, com a importância política que tem o Rio, em pleno século XXI, com o calendário que tem o Rio, fique em último lugar na qualidade do atendimento da saúde pública. É inadmissível.

Isso é porque transformou a saúde pública em um balcão de negócios. Porque a saúde hoje é um lugar para não ter transparência, e para ter muito dinheiro. A gente quer o dinheiro, mas com transparência e eficácia, hoje você não tem. Então a saúde é, sem dúvida alguma no olhar da população, a principal questão a ser resolvida pelo poder público.

CM: E outros problemas?

MF: O Rio hoje é um lugar muito caro para se viver. A gente está pagando muito. Pagando muito para morar, pagando muito para se locomover, para comer, e o resultado disso você não vê em termos de retorno da política pública. Você não tem retorno do estado para o que você está pagando. Nenhum morador do Rio tem.

Outro problema gravíssimo é transporte. Hoje a prefeitura insiste no modelo rodoviário, insiste nas empresas de ônibus. E as empresas de ônibus fazem o que querem. Não há controle sobre os motoristas, porque não se controla as empresas. Há uma diferença brutal entre a forma dos ônibus andarem e agirem no Rio para São Paulo. Você não vê em São Paulo a loucura que os motoristas de ônibus fazem no Rio de Janeiro. E aí não é um problema só com os motoristas, é um problema com as empresas, porque não há multa, não há cobrança, não há postura do poder público defendendo o interesse público.

As passagens aumentam sempre acima da inflação, e não se investe no metrô e nos trens. O BRT (Bus Rapid Transit, corredores exclusivos para ônibus em grandes vias de ligação da cidade, inexplicavelmente batizado em inglês), por que ele não é sobre trilhos? Por que há insistência em modelo rodoviário? Tudo foi feito com o dinheiro público. O BRS (Bus Rapid System), que são aquelas faixas exclusivas nos bairros, se o ônibus está gastando menos naquelas faixas, e gasta muito menos, por que não reduziu o valor da passagem? Por que aumentou acima da inflação este ano? Então não há justificativa para as empresas de ônibus fazerem o que bem entendem. Enfim, esse é um debate que a gente quer travar.

CM: Qual a sua avaliação sobre o metrô?

MF: O metrô é estadual mas cabe ao prefeito debater o metrô, afinal de contas quem usa o metrô é o cidadão do Rio de Janeiro. O metrô serve à cidade do Rio de Janeiro, então o prefeito não pode se omitir deste debate, aliás era uma das promessas do Eduardo (Eduardo Paes, atual prefeito) há quatro anos investir na linha quatro do metrô (projeto de extensão até o bairro da Barra da Tijuca). Não fez, e o governo está fazendo algo contrário, e ele não se manifestou. Então esse é um outro tema decisivo.

CM: E um terceiro ponto importante a ser debatido nesta campanha?

MF: O terceiro tema, você pode escolher entre saneamento, educação, cultura, aí todos são muito importantes, e muito difícil escolher só três. Se você me dissesse só dois, eu não teria dúvidas que saúde e transportes seriam os mais importantes. Três, você tem um leque muito importante de coisas que se relacionam.

Agora, tem um deles que é decisivo. Que diz respeito ao papel do poder público na cidade, fazer nascer de novo a participação política. Estimular que as associações de moradores, que as universidades... nós temos hoje um parque universitário enorme, temos a Universidade Federal Fluminense, que é em outro município (Niterói), temos a Universidade Federal do Rio de Janeiro, temos a Universidade Federal Rural, que é em outro município (Seropédica) mas produz conhecimento sobre a cidade do Rio, você tem a Universidade Estadual do Rio de Janeiro, tem a Universidade Estadual da Zona Oeste. Tem um parque universitário, mesmo que não estejam todos eles dentro do município, todos se relacionam com o município do Rio.

Por que a prefeitura não tem um diálogo permanente com as universidades para que as universidades pensem a cidade e ofereçam saídas para os problemas? Por exemplo, na área de tecnologia, de produção científica. Por que as universidades não são chamadas a pensar e a viver a cidade.

A cidade precisa de transparência, a cidade precisa de participação. As associações de moradores, que começam a dar sinais de renascimento, que já foram muito fortes na década de 80, são extremamente importantes. Então o terceiro ponto eu escolheria a democracia. A gente precisa de um choque de democracia. Mais do que um choque de ordem, a gente precisa de um choque de participação. A ordem tem que existir em qualquer cidade, mas ela pode ser democrática ou pode ser autoritária. Quando não tem transparência, não tem participação, esse choque de ordem é autoritário. E a gente não precisa de autoritarismo. A gente precisa que as pessoas participem e que tenham canais de decisão sobre o que acontece na cidade. Então é isso que a gente está propondo.

CM: Uma das apostas da sua campanha é o uso das redes sociais. Pode explicar como é esse uso?

MF: A rede social na campanha, e no governo, na campanha e no governo. Essa é a primeira campanha com Facebook. Isso é uma novidade. Por incrível que pareça, há dois anos o Facebook não era uma realidade. Há dois anos você tinha Orkut e Twitter como as grandes novidades da campanha. Você vê como o tempo hoje em dia em dois anos oferece uma mudança muito grande. O tempo histórico muda de velocidade com essa questão da internet.

Nossa campanha é uma campanha de rua e de rede. Uma campanha de militância, de muita gente na rua com ideias, ninguém pago, entrando nos bares, nas igrejas, nas escolas, nas associações de moradores, nas casas, e debatendo a cidade. Quem está vindo para a campanha, veio para fazer a campanha e debater a cidade. Uma campanha de cunho pedagógico muito forte.

E o mais importante. A internet é um instrumento dos mais democráticos. Então a gente consegue hoje ter uma rede de diálogo sobre a cidade através da internet, que é extremamente importante, e é diferente de todas as outras épocas que nós vivemos. Hoje o Facebook é uma ferramenta das mais importantes, então a gente quer que a mobilização também aconteça por ali.

CM: Pode dar um exemplo?

MF: Nós temos um minuto e trinta e três segundos de TV. É desigual se você comparar com outras campanhas, porque aqui, ao contrário de outros países, o tempo de TV não é igual para os candidatos, ele tem relação com o tamanho da bancada de deputados federal. Então evidentemente o nosso ficou pequeno porque nós não apostamos nas alianças que tenham outro perfil que não debater a cidade. Mas nós vamos chamar para a internet. Neste um minuto e trinta e três, a gente tem que dar um recado preciso, curto e chamar para a internet.

Nosso interesse é que todo o dia que tenha programa eleitoral a gente tenha também o Twitcam. Acabou o programa eleitoral eu estou na internet conversando com quem quiser. E aí a gente pode transformar esse um minuto e trinta e três segundos em, de repente, uma hora, com um número muito grande de pessoas.

70% dos eleitores do Rio de Janeiro estão conectados à rede. Isso é surpreendente. Tem as lan-houses. Rocinha tem 130 lan-houses. Então a ideia é que a gente passe um processo de democratização da informação através da internet. Isso no governo também. Eu quero banda larga para a Rocinha, eu quero banda larga para o Complexo do Alemão. Eu quero fazer com que a internet seja um instrumento de democratização da informação nas favelas, que é um lugar fundamental. O poder público tem que investir nisso. Isso pode mudar a realidade dessa juventude. Fazer eles dialogarem com o mundo, eles têm o que dizer para o mundo.

CM: Sua candidatura tem grande apoio da juventude conectada, de artistas e intelectuais. O frequentador de botequim, por necessidade, sem smartphone no bolso, vota em Freixo?

MF: Vamos ver durante a campanha. Mas eu acho que sim. Já votou para deputado, não é? Eu fui o segundo deputado mais votado do estado, e com uma votação muito forte em vários setores populares. Este perfil, os antigos geraldinos (frequentadores da antiga Geral do Maracanã), há há há, que agora são os frequentadores do pay-per-view do botequim.

O debate que a gente faz dos megaeventos atinge essa população. Eles têm que ser chamados para esse debate, não pode ficar restrito ao campo dos formadores de opinião, como se diz. Ele tem que se tornar popular porque essa população vai ser talvez a mais atingida, está fora dos espetáculos. É uma cidade espetáculo e esses espetáculos não convidam a todos. Esse é um desafio pedagógico que a campanha tem.

Mas a gente está indo. Já fui a Rocinha duas vezes, vou ao Alemão. Estamos indo para a Zona Oeste, e está muito boa a receptividade, muito boa, surpreendente para mim, inclusive. São caminhos, construções...

CM: Qual a faixa etária dessa boa receptividade? Além da juventude?

MF: Além da juventude. Que reconhece a questão do trabalho da milícia. A gente tem uma legitimidade para entrar na Zona Oeste, que não precisa absorver um discurso supostamente moral. A gente tem uma imagem construída de vida pública e política. E na Zona Oeste a gente teve um enfrentamento histórico em relação às milícias que a população reconhece.


CM: Como está a questão da milícia na campanha?

MF: Olha, a milícia é um tema forte para o Rio de Janeiro, não para a minha campanha. A milícia é o grande entrave ao estado democrático de direito hoje no Rio de Janeiro. São máfias que dominam territórios e, ao contrário de outros grupos, se transformam em domínio eleitoral. Nem todo grupo que domina território transforma esse domínio territorial em domínio eleitoral, a milícia faz. A milícia tem projeto de poder. Tem que ser vista como problema público, e não privado, não particular, de alguém.

CM: O senhor acha que nessas eleições vai aumentar essa participação política da milícia?

MF: Eles perderam muito, foi onde eles mais perderam. Eles não perderam tanto economicamente, os seus negócios foram mantidos, mas muitos milicianos foram presos, os chefes foram presos, e eles perderam voz eleitoral. Eles perderam a vaga que tinham na Assembleia Legislativa, perderam vereadores, do Rio e de outras cidades; então eles perderam politicamente, eles vão tentar recuperar isso nessa eleição, eles vão tentar eleger gente deles, sem dúvida alguma.

CM: Quais os principais desafios da sua campanha?

MF: O desafio da campanha é falar com os diferentes e indiferentes. É ir para além dos que já estão na militância. Conseguir fazer com que rua e rede estejam mais conectados, fazendo a mesma linguagem. É ampliar o debate sobre a cidade, e aí eu acho que o maior desafio, neste momento, é consolidar a ida para o segundo turno. Esse é o desafio, não a dificuldade, mas desafio. O desafio maior é ir para o segundo turno, o que é bom para a cidade, se a gente for para o segundo turno.

Independente de quem vença a eleição a cidade tem que ganhar, a cidade tem que se beneficiar da eleição, fazendo um bom debate sobre os seus caminhos. E eu acho que essa contribuição é o maior desafio, fazer a gente chegar no segundo turno. (Pesquisa Datafolha divulgada no dia 21 mostra Freixo em segundo lugar na corrida eleitoral, com 10% das intenções de voto, atrás do atual prefeito Eduardo Paes, com 54%, e na frente de Rodrigo Maia (DEM), com 6%)

CM: Por que a sua candidatura é a candidatura de esquerda do Rio?

MF: Aí tem que perguntar aos outros partidos porque eles foram para a direita, não porque a minha se manteve onde está. Na verdade não sou eu que estou no endereço errado, são outros aí. A nossa candidatura é uma candidatura de esquerda, sim, e que dialoga com o campo republicano. Ela não é uma candidatura estreita, para marcar posição. Ela é uma candidatura para ganhar a cidade, para disputar a eleição, de fato.

Nesse sentido ela é uma proposta de esquerda com perfil de debate republicano muito forte. São muitos movimentos sociais que se aproximam mas não necessariamente dividem as mesmas bandeiras do partido, mas dividem outras bandeiras da cidade, e aí estão dentro desse campo.

Eu tenho feito muitos encontros. Todos os dias à noite eu tenho algum encontro, com os públicos mais variados, intelectuais das diversas correntes, artistas das diversas correntes, jovens de diversos lugares, sindicatos de vários espaços e trabalhos. O que tem em comum isso tudo? O desejo de ter uma cidade democrática.

Então é uma candidatura de esquerda mas com um perfil democrático, republicano, muito forte. Não é a toa que militantes do PT não concordam com a decisão da cúpula do PT e caminharam para se aproximar da gente. Militantes do PDT, a mesma coisa. O PCB já veio com a gente.

Do outro lado você tem 18 partidos aliados, que cá entre nós, e a negação do debate da cidade. Não há pessoa no mundo que consiga me convencer que esses 18 partidos têm um projeto de cidade. Talvez não tenham nem 18 projetos. Tem projeto de cidade em uma aliança de 18 partidos? Não! Tem projeto de distribuição de cargos, fatiados no poder, e aí reproduz uma lógica de política que a sociedade está negando o tempo inteiro. Então se a gente quer negar, não adianta chegar no poder da mesma maneira. Tem que chegar de outra forma para fazer um governo diferente, senão você não faz um governo diferente.

CM: Como avalia a recente declaração do sociólogo Francisco de Oliveira, fundador do PT e do PSOL, de que o PSOL não representa uma alternativa ao PT pela esquerda?

MF: O mesmo Chico de Oliveira apoia minha candidatura no Rio. Eu soube dessa declaração dele durante entrevista no programa Roda Viva, e o engraçado é que foi no mesmo dia que eu recebi uma declaração dele apoiando a nossa campanha.

Eu acho ótimo que no PSOL exista possibilidade da dúvida e da crítica. O PSOL é uma construção, é muito recente, ele surge em 2005 e ainda tem muitas limitações. Mas se não fosse o PSOL, hoje não existiria a nossa candidatura. Isso também é bom que se diga. Se o PSOL não existisse, nada disso que está acontecendo hoje no Rio teria chance de acontecer, porque a gente precisa do viés institucional partidário, e o PSOL é aonde, com todas as limitações que têm, que elas existem, isso ainda é possível acontecer. Eu acho que o PSOL não sai dessa eleição do Rio de Janeiro da mesma maneira que ele entrou. Eu acho que ele sai mais fortalecido, com um diálogo maior com a sociedade e certamente vai poder cumprir outro papel depois dessa eleição. É o que eu espero.

O PSOL é uma construção, é uma aposta, ainda é cedo para dizer se ele é ou não alternativa. Eu particularmente não fui para o PSOL para criar uma alternativa ao PT, tanto é que eu não virei um antipetista. Eu fui para o PSOL para criar uma alternativa de esquerda, não ao PT.

E acho que essa alternativa está se construindo, evoluindo. O que fazemos no Rio de Janeiro é claramente um papel importantíssimo, e faz o partido evoluir. O partido hoje ter a grandeza de entender que é uma campanha republicana, que vai dialogar com os amplos setores, é sinal de crescimento... é sinal de crescimento.

CM: E nacionalmente, como vê o partido nestas eleições?

MF: Olha, eu tô animado. O que eu estou sentindo é que o Rio virou meio um carro-chefe, influenciando e estimulando outras militâncias. Para você ter uma ideia, outro dia encontrei com o candidato do PSOL em São Luís do Maranhão, que é uma grande figura, o Haroldo Saboia, foi constituinte, é uma figura importante e está muito animado. Estive com o pessoal de Curitiba, Participei de um twitcam com o candidato nosso em Fortaleza, o Renato Roseno, que é um quadro espetacular e está bem lá. O Robaina (Carlos), no Rio Grande do Sul, eu também já participei com ele de diálogos pela internet.

A campanha mais forte do PSOL hoje se dá no Rio e em Belém, o Edmílson (Rodrigues) está na frente, inclusive com uma chance concreta de vitória. A gente tem uma chance concreta de ir ao segundo turno, então os dois lugares... e Macapá, eu não sei se está em segundo ou por ali, o nosso candidato é o Clésio Luis.

Então é um partido que hoje está mais amadurecido e começa a oferecer alternativas reais. E esse é um passo fundamental que o partido dá. Eu acho que o partido em termos da sua participação legislativa, mesmo sendo quantitativamente pequeno, ele é qualitativamente reconhecido. O Randolfe (Rodrigues (AP)) hoje talvez seja um dos senadores mais conhecidos mesmo o PSOL só tendo um senador. A nossa bancada de deputados federais tem três deputados (Chico Alencar (RJ), Jean Wyllys (RJ) e Ivan Valente (SP)), no último Congresso em Foco, entre os quatro melhores deputados federais do Brasil, os três do Psol estavam. Qualitativamente no parlamento o partido já é reconhecido, como nosso mandato aqui no Rio de Janeiro sempre foi muito reconhecido.

Eu acho que o salto que ele dá agora é a disputa das cidades, então ele dá o salto no momento certo. Acho que temos chance de disputar no Rio, como estamos disputando, tem chance de ganhar em Belém, tem chance de fazer um belo papel, com alguma chance de vitória em Macapá, e Fortaleza eu aposto em uma surpresa.

Tem um PSOL sendo amadurecido. Ainda com muita dificuldade porque a conjuntura do surgimento do PSOL é diferente da conjuntura que surgiu o PT. O PT surge no período do fim da ditadura, em um período de ascensão dos movimentos sociais. O PT surge em um momento de ascensão dos movimentos populares, ascensão dos movimentos operários, Teologia da Libertação, movimento intelectual das universidades fortalecido. Então era uma conjuntura muito favorável à criação de um partido de esquerda.

Nós vivemos a construção de um partido em um refluxo. A gente vive a construção de um partido em um momento onde a igreja que cresce não é a mais progressista, as universidades estão em uma situação muito difícil, os movimentos populares muito fragilizados, perderam território em função inclusive de outros problemas sociais. É uma outra conjuntura, por isso que eu acho que não é bom para o PSOL uma análise comparativa permanente com o PT, por mais que as nossas origens não possam ser negadas, eu acho que o PSOL tem que ter uma história própria.


Fonte: Carta Maior

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