quinta-feira, 26 de julho de 2012

26 de Julho de 1953 - "A História me absolverá!" (16 de outubro de 1953)

Quando no dia 26 de Julho de 1953 um grupo de 135 jovens comandados por Fidel Castro participou no assalto ao Quartel Moncada em Santiago de Cuba, na tentativa de a partir daí armar a população para derrubar o governo fantoche de Fulgêncio Batista, estavam muito longe de imaginar o que viria a passar-se nos seis anos seguintes. Desta acção resultou a morte da maioria dos revolucionários e a prisão dos restantes, tendo Fidel sido condenado a 15 anos de prisão, em cujo julgamento proferiu a célebre frase de que “a história me absolverá”.

Pese embora a derrota militar sofrida, este dia acabou por marcar definitivamente o rumo do futuro movimento revolucionário que adoptou a sigla M-26, desenvolvendo-se por todo o país acções de sensibilização e recrutamento de apoiantes que na clandestinidade se preparavam para o momento em que os principais líderes seriam libertados, já que a pressão exercida quer por instituições, quer pelo povo anónimo a isso conduziria inevitavelmente.

Por isso, foi com enorme expectativa e interesse que tive a oportunidade de visitar o “presídio modelo” na Ilha da Juventude onde Fidel, Raul e os restantes companheiros estiveram encarcerados, podendo, pelo que vi, imaginar as precárias condições e o total isolamento a que foram submetidos até à sua libertação em 15 de Maio de 1955, beneficiando de uma amnistia presidencial. Nesse mesmo dia e instado pelos jornalistas que o aguardavam, Fidel afirmou: “continuaremos lutando até obter a independência de Cuba”.

Exilando-se no México dois meses após a sua libertação, Fidel inicia de imediato os preparativos para voltar a Cuba com uma expedição de revolucionários, desembarcando do pequeno iate “granma” no dia 2 de Dezembro de 1956 na praia “Las Coloradas” e daí seguindo para a “Sierra Maestra” onde permaneceu dois anos até ao triunfo da Revolução em 1 de Janeiro de 1959.

Se até aí o “Movimento 26 de Julho” tinha desempenhado um extraordinário trabalho na organização política de inspiração Martiana, a partir do início da luta armada passou também à acção militar e ao apoio logístico dos revolucionários que combatiam o exército governamental.

Assim e em homenagem a todos os “Moncadistas” é celebrado em 26 de Julho o Dia Nacional de Cuba com manifestações patrióticas por todo o país, nunca esquecendo aqueles que nesse dia deram a sua vida para que hoje Cuba possa ser livre e independente de qualquer subjugação imperialista.

Como escreveu José Marti, “Pátria é comunhão de interesses, unidade de tradições, unidade de fins, fusão docíssima e consoladora de amores e esperança”.






A HISTÓRIA ME ABSOLVERÁ!

Discurso de defesa de Fidel Castro, por ocasião de seu julgamento pelo ataque ao quartel de Moncoda, em 16 de outubro de 1953.

“A primeira condição da franqueza e da boa fé num propósito é fazer exatamente o que ninguém faz, ou seja, falar com absoluta clareza e sem medo. Os demagogos e os políticos profissionais querem praticar o milagre de estar bem com tudo e com todos, enganando necessariamente a todos em tudo. Os revolucionários devem declarar suas idéias com coragem, definir seus princípios e revelar suas intenções para que nenhuma pessoas se engane, nem amigos nem inimigos...”

(...) “Cuba poderia abrigar maravilhosamente uma população três vezes maior. Não existe, portanto, razão para que haja miséria entre seus habitantes. Os mercados deveriam estar repletos de produtos. As despesas das casas deveriam estar cheias. Todos os braços poderiam estar produzindo com labor. Não, isso não é concebível. O inconcebível é que existam homens que durmam com fome enquanto uma polegada de terra sem semear. O inconcebível é que existam crianças que morrem sem cuidados médicos. O inconcebível é o fato de 30 por cento de nossos camponeses não saberem assinar o próprio nome e 99 por cento não conhecerem a história de Cuba. O inconcebível é a maioria das famílias de nossos campos estarem vivendo em condições piores que os índios encontrados por Colombo ao descobrir a terra mais bonita que os olhos humanos já contemplaram...”

(...) “Vou contar-lhes uma história. Era uma vez uma república. Tinha uma Constituição, suas leis, suas liberdades. Presidente, Congresso, tribunais. Todo mundo podia se reunir, associar-se, falar e escrever com inteira liberdade. O governo não satisfazia o povo, mas este podia mudá-lo, e faltavam apenas poucos dias para fazê-lo. Havia uma opinião pública respeitada e acatada, e todos os problemas de interesse da população eram discutidos com liberdade. Havia partidos políticos, (...) programas polêmicos de televisão, manifestações, e palpitava no povo o entusiasmo. Esse povo tinha sofrido muito, e se não era feliz queria sê-lo, e possuía tal direito. Tinha sido enganado muitas vezes, e via o passado com verdadeiro horror. Acreditava cegamente que esse passado não poderia voltar. Estava orgulhoso de seu amor à liberdade e vivia convicto de que ela seria respeitada como coisa sagrada. Sentia uma confiança digna, de que ninguém ousaria cometer o crime de atentar contra as instituições democráticas. Queria uma mudança, algo melhor, queria um avanço e os percebia próximos. Toda a sua esperança estava no futuro.

“Pobre povo! Uma manhã a população acordou estremecida. Nas sombras da noite, os fantasmas do passado se haviam conjurado, enquanto ela dormia, e eis que a tinham agarrado pelas mãos, pelos pés e pelo pescoço. Aquelas garras eram conhecidas, (...), aquelas botas... não era um pesadelo, tratava-se da horrível realidade: um homem, chamado Fulgêncio Batista, acabava de combater o terrível crime que ninguém esperava.

“Aconteceu, então, que um simples cidadão daquele povo, que desejava acreditar nas leis da república e na integridade de seus magistrados, a quem vira muitas vezes enraivecer-se contra os infelizes, procurou o Código de Defesa Social para ver quais castigos previa a sociedade para o autor de semelhante ato...

(...) “Sem dizer nada a ninguém, com o código em uma mão e os papéis na outra, o tal cidadão apresentou-se no antigo casarão da capital, onde funcionava o tribunal competente, que tinha a obrigação de instaurar processo e punir os responsáveis por aquele ato, e apresentou um documento em que denunciava os delitos e pedia para Fulgêncio batista e seus dezessete cúmplices a condenação a 108 anos de prisão, como previa o Código de Defesa Social, com todas as agravantes de reincidência, perfídia e ação na calada da noite.

(...) “Senhores juízes: sou eu aquele humilde cidadão que um dia apresentou-se inutilmente diante dos tribunais para lhes pedir que punissem os ambiciosos que violaram as leis e destroçaram as nossas instituições. E agora, quando sou eu o acusado de querer derrubar esse regime ilegal e restabelecer a Constituição legítima da república, sou mantido incomunicável numa cela por 76 dias, sem poder falar com ninguém nem sequer ver meu filho. Sou levado pela cidade entre duas metralhadoras (...), sou transferido a este hospital para ser julgado em segredo com toda a severidade e um promotor, com o Código na mão, solenemente, pede para mim 26 anos de prisão.

“Dirão que aquela vez os juízes da república não atuaram porque estavam impedidos pela força. Confessem, então: desta vez também a força os obriga a condenar-me. Da primeira vez não puderam punir o culpado. Da segunda, terão de castigar o inocente. A donzela da Justiça é duas vezes violada pela força.

“E quanta impostura para justificar o injustificável, explicar o inexplicável, conciliar o inconciliável! Até que decidiram por fim afirmar, como motivo supremo, que o fato cria o direito. Ou seja, que o fato de ter lançado os tanques e os soldados à rua, tomando o palácio presidencial, o Tesouro da república, e os demais edifícios oficiais, e de apontar armas para o coração do povo cria o direito de governá-lo. Argumento semelhante utilizaram os nazistas que dominaram os países da Europa e neles instalaram governos ditadores.

Reconheço e aceito que a revolução seja fonte de direito. Mas não se poderá chamar nunca de revolução o assalto noturno, a mão armada, de 10 de março...”

(...) ”Nem no sentido de modificações profundas no sentido social, nem sequer na superfície do pântano público moveu-se uma onda que agitasse a podridão reinante. Se no regime anterior existia politicagem, roubo, pilhagem e ausência de respeito pela vida humana, o atual regime multiplicou por dez a pilhagem e multiplicou por cem a falta de respeito pela vida humana.”

(...)”...Como considerar juridicamente válida a alta traição de um tribunal cuja missão era defender nossa Constituição? Com que direito mandar para a prisão homens que vieram para dar seu sangue e sua vida pelo decoro de sua pátria? Isso é monstruoso diante dos olhos da nação e os princípios da verdadeira justiça!”

(...) “...e a ilha se afundará no mar antes que consintamos em ser escravos de alguém.”

(...) “Termino minha defesa, mas não como fazem sempre todos os advogados, pedindo a liberdade do acusado. Não posso pedi-la enquanto meus companheiros sofrem na ilha de Pinos ignominiosa prisão. Mandem-me para perto deles a fim de compartilhar a sua sorte. É concebível que os homens de valor estejam mortos ou presos numa república em que o presidente é um criminoso e um ladrão.

“Aos senhores juízes, minha sincera gratidão por terem permitido que eu falasse livremente, sem mesquinhas coações. Não lhes tenho rancor. Reconheço que em alguns aspectos foram humanos e sei que o presidente deste tribunal, homem honrado, não pode dissimular sua repugnância pelo estado de coisas reinante, que faz ditar uma sentença injusta...

“Quanto a mim , sei que a prisão será dura como nunca foi para ninguém repleta de ameaças, de provocações covardes e vis. Mas não temo isso, como não temo a fúria do tirano desprezível que extinguiu a vida de setenta irmãos meus. Condenem-me, não importa.

A História me absolverá!








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