quinta-feira, 20 de junho de 2013

Novo estilo de golpe: direita busca as ruas e ressuscita inflação

Hoje, 10 de abril, deputados do Democratas fizeram um protesto criativo no plenário da Câmara. Eles empurraram para dentro da sessão um carrinho de supermercado cheio de tomates, que se tornou o símbolo do aumento da inflação nos últimos meses.


É o momento das forças de esquerda unificarem a luta, incidirem sobre o debate político ideológico e pressionarem o PT a tomar alguma posição


Por Luiz Felipe Albuquerque

- Filho, você vai no ato amanhã?

- Claro, mãe. Por quê?

- Olha, realmente não sei nada de política, mas peço que não, porque acho que vai rolar um Golpe de Estado.

Parece absurdo, mas esse diálogo – que de fato ocorreu com um amigo – é sintomático.

No meio da manifestação desta segunda-feira (17), em São Paulo, começou a se falar sobre uma suposta ocupação do Congresso Nacional.

Foi preocupante.

- Sabe como se chama isso?

Disse um companheiro de organização.

- Golpe de Estado.

Felizmente, como sabemos, não foi o que ocorreu. Mas esse momento de tensão nos leva a algumas reflexões.

Logo após a manifestação da última quinta-feira, a linha editorial dos principais meios de comunicação mudou de tom radicalmente.

Se na quinta pela manhã eles inescrupulosamente pediam à Polícia Militar agir com violência, na sexta as principais manchetes repudiavam a ação dos PMs. Se não pode vencê-los, junte-se a eles, e busque cooptá-los.

A mudança de discurso é significativa. Representa um oportunismo da direita para criar um clima de instabilidade nacional. Agora, as manchetes centralizam suas forças principalmente sobre o governo federal.

A preocupação com os megaeventos esportivos, o distanciamento do PT com as massas e sua incapacidade de diálogo, a suposta popularidade da presidência em queda, as vaias na abertura da Copa das Confederações.

A pauta política está dada. Agora, a direita busca a pauta econômica para concretizar seu discurso e desestabilizar o governo. E com isso, começam a retomar a questão da inflação.

O editorial da Folha desta segunda diz que, com exceção dos beneficiados do novo programa federal Minha Casa Melhor, “todos os outros brasileiros, em contraste, veem sua capacidade de consumo estreitar-se de forma acelerada, sob o golpe duplo do aumento da inflação (que já corrói os salários) e dos juros (que deve onerar as compras a prazo)”.

A história nos ensina que as contraofensivas se realizam com mais sucesso se for respaldada de um artefato sólido, ao entrelaçar elementos políticos aos econômicos.

E é o que estão buscando. “Dilma Rousseff resvalará para o autoengano, porém, se desconsiderar que as vaias vieram na semana em que se espalharam pelo país protestos contra altas de preços (tarifas de transportes) e contra o que alguns percebem como mau emprego de verbas públicas (nos eventos esportivos, entre outros)”.

E já atestam como fato dado que no ano pré-eleitoral, “são fortes os sinais de que se rompe a bolha de otimismo que levou Dilma ao Planalto”.

“O que aflige os brasileiros é a perda de poder aquisitivo, com a inflação, e a incapacidade do Estado de apresentar soluções concretas para a crise nas áreas vitais de saúde, educação, segurança e transportes. Mais consumo e mais futebol não resolvem nada disso”, termina o editorial.

Mentira. Os espasmos inflacionários que a tese dominante tanto aposta evolui pouco perto do estardalhaço. A última nota técnica do Dieese (abril), mostra que entre março de 2012 a março de 2013, o IPCA evoluiu 6,59%, enquanto os preços dos alimentos, 13.49%.

Se não fosse o problema do subgrupo alimento, que ocorre devido a problemas sazonais e estruturais da agricultura brasileira (como bem coloca Gerson Teixeira em seu artigo O agronegócio é ‘negócio’ para o Brasil?), o IPCA teria sido de 5.07%, segundo simulação feita pelo Ministério da Fazenda. A meta central de inflação dentro do intervalo de tolerância é de 6,5%.

 inflação

Tentam misturar as coisas, confundir e influenciar sobre um movimento ainda bem descentralizado. Soma-se a isso o fato da grande maioria (a redundância aqui é proposital) dos que participaram das manifestações não serem organizados e, ainda, rechaçarem violentamente partidos políticos e não terem uma compreensão clara sobre a necessidade organizativa.

Ao longo da marcha, bandeiras do PSTU foram tomadas por algumas pessoas. A Juventude do PT foi ameaçada por outro grupo e teria apanhado, não fossem outras organizações que estavam por perto e apaziguaram a situação. Boa parte do clima era de ódio com a política, com políticos e com partidos.

O momento é delicado. É necessário que a esquerda tenha isso em mente e, se ainda é possível, também coloca uma responsabilidade e necessidade do PT deixar de ser bundão, ser mais protagonista, polarizar o debate e politizar as massas.

E é o momento das forças de esquerda unificarem a luta, incidirem sobre o debate político ideológico e pressionarem o PT a tomar alguma posição. Sempre reforçando a pauta central: diminuição dos preços do transporte público, e não ampliando como a direta pretende.

A direita, longe de ser boba, está se aproveitando. E para capitalizar essa gente para servir a ela como massa de manobra, não é preciso muito devido o grau de despolitização que o período neoliberal nos deixou.

Sem dúvida, as políticas sociais dos governos petistas melhoraram a vida do povo em muito, mas apenas no âmbito do consumo. Sem nunca se preocuparem com o processo de politização da classe trabalhadora. O que nada garante que num momento de polarização do debate e uma ofensiva da direita, as massas saiam às ruas em defesa desse governo ou partido.

Se outrora o trabalho de base pelo PT era uma das prioridades, há muito ele foi abandonado. E esse vazio político deixado tem que ser preenchido e aproveitado por essa aliança de forças dentro da esquerda.

Ainda resta um dilema ao PT: ou o maior partido político que ainda se diz de esquerda vai para a ofensiva, ou corre um sério risco de dar um tiro no próprio pé.

Enfim, de fato, não acredito que as angústias de Golpe de Estado estejam colocados por hora, mas sem dúvida é um importante momento de reflexão para ocasiões futuras.


Luiz Felipe Albuquerque é do setor de comunicação do MST.


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