quarta-feira, 4 de julho de 2012

O Destino Manifesto do Povo Estadunidense: Uma Análise dos Elementos Delineadores do Sentimento Religioso Voltado à Expansão Territorial


O “Destino Manifesto” legitimou a Marcha para o Oeste nos EUA, no século XIX
e o Imperialismo do século XX


Por Priscila Borba da Costa


O presente artigo analisa de que forma o Destino Manifesto, conjunto de crenças nacionalistas e expansionistas embevecidas pela religião e pela ética protestante, serviu de princípio legitimador para a ocupação e anexação de territórios do Oeste dos Estados Unidos durante o século XIX. Para tanto, o estudo examina  a origem do conceito de Destino Manifesto dos estadunidenses e de que forma ele está relacionado com um espírito colonizador europeu intensificado pelo sentimento de ruptura do novo homem guiado por Deus na América a partir do século XVIII, isto é, da figura religiosa do Adão que tinha somente o futuro pela frente, desvinculado da história. A partir do arcabouço teórico delineado por Mary Anne Junqueira, João Feres Junior e Shane Mountjoy, o presente artigo apresenta, com base em pesquisa bibliográfica, como a expressão “Destino Manifesto” foi cunhada em meados do século XIX por John O’Sullivan, condensando uma ampla gama de crenças relacionadas ao papel designado por Deus para os estadunidenses, responsáveis por levar o progresso para os chamados selvagens (povos nativos) e expandir o território da grande nação em construção. Neste sentido, o Destino Manifesto caracteriza-se pelo sentimento de superioridade étnica do branco frente ao indígena, pela auto-suficiência do povo estadunidense em face dos colonizadores britânicos e pelo destino pré-determinado por Deus para o progresso ilimitado e propagação de valores inerentes ao povo estadunidense, tal como a liberdade, a religião civil e a democracia. Constata-se que a forte religiosidade foi um fator determinante para o florescimento do Destino  Manifesto como princípio legitimador para ações expansionistas no século XIX, visto que o povo estadunidense acreditava que Deus estava conduzindo a progressiva expansão da civilização moderna para territórios distintos das antigas colônias. O Oeste era considerado um território repleto de possibilidades e pronto para ser desbravado por aqueles que detinham o conhecimento e a missão divina de levar a civilização onde haveria selvageria. De acordo com  o Destino Manifesto, a expansão territorial não era motivada apenas por interesses  econômicos, mas era legitimada pelo convencimento de que aquela era a missão divina a ser cumprida na terra pelos estadunidenses. Pelo simples fato dos habitantes locais, vítimas da dominação, recusarem-se a aceitar a anexação dos territórios aos Estados Unidos, estes eram considerados pecadores, pois estavam negando o representante enviado por Deus para realizar a missão do progresso. 
O artigo conclui que, passado mais de um século, o  sentimento expressado no Destino Manifesto ainda é presente nos estadunidenses, os quais vinculam grande parte das intervenções externas a motivos religiosos de propagação da liberdade e dos valores da nação protegida por Deus.



Introdução

Os ex-colonos dos Estados Unidos da América são conhecidos por seu espírito desbravador, responsáveis por levar o “progresso da civilização” para locais anteriormente ocupados com comunidades tradicionais, hoje extintas em solo estadunidense. A história da ocupação e anexação de territórios nos Estados Unidos é marcada por um sentimento peculiar deste povo, caracterizado pela ideia de que os Americanos exerciam um papel designado por Deus. 
O presente artigo busca explorar as origens deste conjunto de crenças que legitimou a ocupação do Oeste e outros territórios durante o século XIX. Tal espírito expansionista é chamado de  Manifest Destiny. Em síntese, o Destino Manifesto foi uma doutrina estadunidense baseada em preceitos religiosos que legitimava e justificava a expansão dos estadunidenses a territórios alheios para a sua anexação ao território dos Estados Unidos.  Tal ideia implicava que os estadunidenses eram um povo  abençoado por Deus e escolhido especialmente para levar o esclarecimento aos “povos inferiores” da América do Norte. Apesar de o termo ter sido utilizado pela primeira vez em meados do século XIX por John O’Sullivan em um ensaio sobre a anexação do Texas, o espírito do Destino Manifesto é ainda mais antigo e carrega fortes significados no  imaginário estadunidense. Com o aval religioso e a missão enviada diretamente dos céus, por Deus, os Estados Unidos tomavam o direito de agir da forma mais arbitrária a fim de ocupar territórios e aniquilar populações contrárias ao seu destino. A doutrina foi amplamente utilizada por políticos, meios de comunicação e até hoje deixa vestígios no espírito do cidadão estadunidense. Este sentimento é ainda perceptível nas condutas militares, econômicas e políticas, principalmente no que diz respeito às relações externas do país.  


O Destino Manifesto: um sentimento que conduz à ação 

Nos Estados Unidos da América, o século XIX foi fortemente marcado pela conquista da parte Oeste do que é hoje o seu território nacional. Neste breve estudo, será analisado o sentimento por trás da ação expansionista dos estadunidenses e de que forma este sentimento está ligado com uma ideia religiosa de superioridade étnica e progresso civilizatório, característicos do calvinismo e da ética protestante. Especificamente, será abordado o fenômeno do Destino Manifesto, conjunto de crenças  dos estadunidenses que marcou esta sociedade em determinado momento histórico. Uma das características que auxiliam na compreensão do perfil expansionista do povo estadunidense é a íntima correlação com o espírito colonizador dos britânicos e europeus que criaram os Estados Unidos. Todavia, o que diferencia o estadunidense é o rompimento com a metrópole e a ideia de que o Novo Mundo, a América, significava um começo a partir do zero, uma ruptura com o passado, sendo o “povo americano” a síntese do novo homem, o Adão que teria apenas o futuro pela frente. Baseados na crença de serem parte de uma nova nação especialmente escolhida por Deus e destinada  a ser a maior de todas elas, os estadunidenses deram intensificaram sua expansão territorial. Ramos e Miranda, em seu artigo para a revista Ameríndia, colocam a importância do discurso religioso e sua influência no aspecto político dos Estados Unidos ao longo da sua história: 

"Ao se estudar os acontecimentos político-sociais dos Estados Unidos na própria emancipação das ditas “Treze Colônias”, base territorial fundante do país, percebemos a importância da coletividade, diversificada, porém agregada pelo discurso unificador de “One Nation Under God”, que se apropria dos valores que estas sociedades já traziam, tais como a família, o trabalho, o esforço individual (aquilo que Weber coloca como Ética Protestante) e  os difundem, legitimando-os como valores-base para a nova Nação que se coloca no cenário mundial. Em suma, uma sociedade de imigrantes que quer se unir em torno do discurso do nacionalismo" (RAMOS E MIRANDA, 2007) 

Como expressam os autores, a religião civil está presente a todo o momento – e isso é verificado atualmente – nos discursos políticos, nos programas de entretenimento, nos espaços públicos, nas valorizações dos heróis cívicos e de guerra. “No imaginário estadunidense, a importância de certos ritos e práticas coletivas reflete a ênfase da religião civil, disfarçada de ‘moral e ética cristãs’ em compreender Deus como elemento unificador da pátria” (RAMOS e MIRANDA, 2007). Os autores colocam que é notável a presença da religiosidade, da crença em Deus e dos valores cristãos, mas alertam que este sentimento permeia as relações políticas e sociais.  
A doutrina Destino Manifesto vem dos preceitos calvinistas de que “Deus escolhe seus "eleitos” e é um conceito estruturado a partir da premissa de que o povo estadunidense é escolhido por Deus e tem como missão levar o esclarecimento aos povos considerados inferiores (pressupõe, ainda, que os estadunidenses são soberanos, portanto todos seriam submetidos a eles nesta missão).

"Deus escolheu a América para que aqui se construísse a sede do paraíso terrestre, por isso, a causa da América será sempre justa e nada de mal jamais lhe será imputado. Os colonos são os verdadeiros herdeiros do povo eleito, pois prestavam a Santa Fé. Nossa missão é liderar os exércitos de luz em direção aos futuros milênios." (Pregações Puritanas, 1660 apud OLÍMPIO & MAIA, 2006, p. 6) 

Embora não seja a época abordada neste trabalho, é importante relembrar a questão das peregrinações do século XVII, que permite entender o pano de fundo desse sentimento religioso e de responsabilidade divina do estadunidense. A questão está amplamente desenvolvida no trabalho de Mary Anne Junqueira, Ao Sul do Rio Grande (2000), onde é possível perceber a relação do apego religioso desde o século XVII quando os primeiros peregrinos recusavam-se a manter relações com a igreja inglesa e comprometiam-se com a imagem dos hebreus, o povo eleito por Deus. Junqueira conta que os peregrinos permaneceram fortemente no imaginário estadunidense no que diz respeito à colonização. Ainda, no momento da conquista, embora num primeiro momento houvesse uma relação com os índios, – e fica claro no texto de Junqueira que esta relação era de interesse pelo conhecimento dos nativos à nova terra – num segundo momento, procuravam civilizar o novo território e acreditavam ter poder sobre o destino de seus antigos habitantes. (JUNQUEIRA, 2000, p. 74-76)
Esta perspectiva é interessante, pois auxilia a compreender um primeiro ponto essencial que é a exploração do  wilderness, conceito amplamente trabalhado no livro de Junqueira: áreas nunca antes exploradas pelos estadunidenses, habitados pelos chamados homens selvagens e bestas.

"O  wilderness e a fronteira marcaram profundamente o imaginário  nacional nos Estados Unidos, permitindo reforçar o excepcionalismo norte-americano. Segundo este imaginário, foi no Oeste que se construiu a nação norte-americana. Portanto, entender como os norte-americanos percebiam o seu próprio espaço territorial é importante para compreender como eles viam a si mesmos e às outras culturas" (JUNQUEIRA, 2000, p. 69). 

Junqueira explica ainda que, embora sejam tratados  como fato heróico na história estadunidense (e ocidental), esses fatos configuraram uma cena de forte devastação e aniquilação de comunidades indígenas para o estabelecimento da pequena propriedade privada. No entanto, a fronteira era vista como um mundo de possibilidades não existentes na civilização. Neste novo mundo era possível enriquecer, construir uma nova vida com um espaço ilimitado pronto para novas produções e descobertas (JUNQUEIRA, 2000, p. 70). O wilderness trazia uma ideia de recursos ilimitados e de desenvolvimento econômico. Todas essas questões, na visão do povo estadunidense, permitiam e legitimavam a conquista territorial e a violência cometida nessas explorações.   
Após a formação deste contexto vem a Independência  e, não por acaso, todo esse quadro influenciou fortemente no ideário de nação que se desenvolveu a seguir. É ainda na obra de Mary Anne Junqueira que é possível configurar essa pintura de uma nação única formada por estadunidenses, descendentes diretos dos peregrinos, o povo considerado eleito por Deus. Junqueira explica com detalhes que os estadunidenses 

"acreditavam que o mundo que constituíam era diferente e superior a todos os outros que existiam na Europa. (...) Com a Independência criou-se ainda outra ideia: a de que o norte-americano era um novo tipo de homem, completamente desvinculado do passado, “emancipado da História”. (...) o início de uma nova História desconectada do passado: o Adão norte-americano tinha apenas o futuro pela frente. (...) a nascente democracia norte-americana vinha acompanhada por um enorme sentimento de possibilidades, mas também por sentimentos de impaciência, intolerância e hostilidade. Ao novo homem norte-americano, tido como inocente e dotado de energia excepcional, cabia uma tarefa incomum: construir um mundo a partir do zero." (JUNQUEIRA, 2000, p. 77)

Tendo em mente esse sentimento de ruptura explicado por Junqueira que é possível compreender a ideia nacionalista expressada no século XIX nos Estados Unidos como Destino Manifesto. Shane Mountjoy, professor de História da Universidade de York e autor de um esclarecedor livro sobre o tema, explica que o termo Destino Manifesto, criado no século XIX, condensava sentimentos nacionalistas e expansionistas já enraizados nos estadunidenses. A origem do termo está ligada à política expansionista de meados do referido século. Foi John O'Sullivan quem o utilizou para descrever seu sonho a respeito do futuro da América. No ensaio chamado "Annexation", escrito em 1839 (publicado somente em 1845), declarou apoio à aquisição do Texas pelos estadunidenses, defendendo que era o cumprimento do destino manifesto espalhar o continente e que lhes era atribuído pela Providência (MOUNTJOY, 2009, p. 9).

"Why, were other reasoning wanting, in favor of now elevating this question of the reception of Texas into the Union, out of the lower region of our past party dissensions, up to its proper level of a high and broad nationality, it surely is to be found, found abundantly, in the manner in which other nations have undertaken to intrude themselves into it, between us and the proper parties to the case, in a spirit of hostile interference against us, for the avowed object of thwarting our policy and hampering our power, limiting our greatness and checking the fulfillment of our manifest destiny to overspread the continent allotted by Providence for the free development of our yearly multiplying millions" (O’SULLIVAN, 1945).

Neste documento, é discursada a missão destinada aos Estados Unidos e é explícita a noção de que eram eles os responsáveis pela propagação dos princípios divinos, deixando claro que sentiam que eram capazes de espalhar o progresso e o desenvolvimento e que estavam fazendo o mesmo pela Providência Divina e, de acordo com essa lógica, não havia sentido algum em interromper a vontade divina. Além disso, sentiam que constituíam a nação do progresso, da liberdade individual e da emancipação universal, como apontam os autores Olímpio e Maia.  
O uso do termo “Destino Manifesto” neste primeiro ensaio de O’Sullivan foi praticamente imperceptível. Mais tarde, no mesmo ano, ele usou o termo novamente, com relação à anexação do território do oeste, Oregon. Defendia que a Providência ordenava que os EUA estendessem sua única forma de governo, o então chamado "grande experimento de liberdade e autogoverno federativo" (MOUNTJOY, 2009, p. 10). Entretanto, foi na terceira vez que O'Sullivan usou a expressão, que quase imediatamente foi adotada pelos demais. Os Democratas foram os primeiros a usar o termo à exaustão. O termo passou a simbolizar a ideologia e o desejo dos Estados Unidos de expandir. A frase era um termo breve e prático para expressar apoio ao projeto de expansão ao Oeste. Essas terras eram adquiridas da Grã-Bretanha e especialmente do México e, em particular, o Texas e Oregon. Quando em guerra com o México, os EUA buscaram outros territórios como o Novo México e Califórnia. Tais expansões eram naturais para os estadunidenses, afinal era o "destino". No início do século XIX, surge, então, a manifestação nacionalista que considera seu destino a anexação de territórios. O Destino Manifesto está inserido num contexto histórico, desenrolado por Junqueira, de uma religiosidade e uma missão divina que permitia a anexação e governo de territórios que não pertenciam aos Estados Unidos. Os estadunidenses, que já se consideravam privilegiados e enviados por Deus, acreditavam ter a responsabilidade de civilizar o bárbaro e o impuro. A missão era carregada de nobreza e altruísmo. Este desenho nos permite contemplar com mais clareza a ideia de Destino Manifesto. Foi, então, a partir dessas premissas que os estadunidenses consideravam que deveriam anexar (comprando ou tomando) o território dos povos inferiores e aplicar um processo civilizatório, fazendo com que os povos destes territórios anexados se submetessem ao seu governo e ao seu modo de
vida.  
Olímpio e Maia ainda explicam que a diferença racial é outro fator bem presente. Ela justifica os padrões morais e ainda considerava-se  impossível associar as práticas estadunidenses com más ações neste contexto de expansão, já que estariam cumprindo uma ordem divina. Os mexicanos, por outro lado, pecariam apenas por recusar a oferta dos estadunidenses de anexação do seu território, contrariando o desejo de Deus. 
Feres Júnior aborda esta questão, através do pensamento de Ralph Waldo: o “sentimento de superioridade racial americana está amparada por um poder ainda mais alto: a vontade de Deus, a Divina providência - frente a qual as ‘questões seculares’ perdem importância” (FERES JUNIOR, 2004, p. 83).  Vê-se, portanto, a clara percepção de superioridade legitimada pela autoridade maior e indiscutível, Deus. Sendo que o objetivo é o triunfo e nada ou pouco importam os motivos para a realização dessas ações.
Nos conflitos que se seguiram, dentre os territórios anexados, estavam os das colônias espanholas (Cuba, Porto Rico, Filipinas e a ilha de Guam) e consideravam os habitantes destas colônias "raças indesejáveis" e indagavam-se o que fazer com eles. Albert Beveridge (historiador e senador - 1900) declara:  

"Ele [Deus] nos fez os mestres organizadores do mundo para estabelecer um sistema onde reina o caos. (...) Ele nos fez adeptos do bom governo para que possamos administrá-los aos povos selvagens e senis (...) ele marcou o povo americano como Sua nação escolhida para finalmente liderar no trabalho de regeneração do mundo. Essa é a missão divina da América (...) Nós somos os depositários do progresso mundial, os guardiões da paz virtuosa" (BEVERIDGE apud FERES JUNIOR, 2004, p. ).  

Feres Júnior ainda explica que, “segundo essa concepção, a graça divina é o princípio organizador da história humana, e os americanos seus agentes verdadeiros e legítimos” (FERES JUNIOR, 2004, p. 85). E continua: o expansionismo estadunidense se dá por terra, mas essas ações se justificam, pois são de ordem divina e o estadunidense é o portador dessa missão, tendo ele o conhecimento privilegiado do divino, ficando inviável contra-argumentar com uma razão prática de ordem secular.
Vemos ainda, em Mountjoy, que em termos práticos, os Estados Unidos não adotaram o Destino Manifesto como política. O conceito influenciou a política do país, especialmente nas ultimas seis décadas do séc XIX e incorporou muitas crenças como o expansionismo, nacionalismo, excepcionalismo estadunidense e, em alguns casos, a ideia de superioridade racial. A expressão é, dessa forma, carregada de muitas ideias que serviam de justificativas e
entraram no imaginário do cidadão estadunidense. Os expansionistas de 1840 e 1850 reconheciam o lugar e a época como cenário perfeito para expandir os EUA e estavam convencidos de que seriam bem sucedidos e que as condições superiores dos estadunidenses propagariam o progresso. Três conceitos-chave que fundamentavam a doutrina: virtude, missão, e destino. Isso queria dizer que, primeiramente, a sociedade estadunidense e seus cidadãos eram virtuosos e isso justificava a expansão. Segundo, era a missão dos estadunidenses estenderem sua sociedade. Fazendo isso, iriam influenciar o restante do mundo. Por fim, era o destino dos Estados Unidos assumirem a tarefa de cumprir essas predestinações (Mountjoy, 2009, p.12).  


Progresso Americano, 1872. Por John Gast. 

Possivelmente a imagem mais conhecida do século XIX que representa o Destino Manifesto seja uma pintura de 1872 por John Gast, chamada "Progresso Americano". A pintura traz uma mulher de cabelos claros, vestida de forma clássica, com tecidos brancos e leves revestindo seu corpo, e que está guiando os estadunidenses ao Oeste. Ela está conduzindo pioneiros, fazendeiros, mineiros, vagões e trilhos. O quadro ilustra a visão de que a conquista estadunidense era um sinal de progresso e que levava a civilização e a prosperidade a pessoas não-esclarecidas (MOUNTJOY, 2009).


Conclusão 

A análise da doutrina do Destino Manifesto e os caminhos tomados a partir dela permitem algumas reflexões. O cientista político João Feres Junior, amplamente citado neste trabalho, defende que o único resultado possível almejado pelos estadunidenses seria a realização completa da missão de civilizar os inferiores. No entanto, o impasse da diferença racial seria permanentemente um fato complicador, analisando pela perspectiva da doutrina, pois se trata de um fator biologicamente determinado, impossibilitando a equiparação dos povos inferiores aos estadunidenses. Diante disso,  é possível imaginar um quadro de intolerância e incompatibilidade de anseios. O ato de expandir é obviamente limitado, indo ao extremo quase que inimaginável de uma conquista de território mundial (mesmo sabendo que este não era o objetivo dos Estados Unidos), por outro lado, tomando como base a visão de Feres Junior, à medida que o estadunidense avançasse e conquistasse novos territórios, logo enfrentariam choques culturais, sociais, políticos e econômicos, fatores incompatíveis com a vida dos estadunidenses. A solução seria adaptar os colonizados ou, no limite, exterminá-los. A intolerância da diferença cultural, econômica, política e social é refletida até hoje no cenário mundial – e é notável a interferência (na maioria das vezes partindo do Ocidente) em outros contextos, por vezes ferindo o modo de vida  de outras culturas – sob o manto legitimador dos direitos humanos, da democracia e da liberdade individual.  
A doutrina do Destino Manifesto, como explicado, passou a significar um espírito ideológico e a carregar significados muito fortes, além de sustentar ideais convenientes para o crescimento e fortalecimento hegemônico do país. A religião exerce papel determinante aqui. Tal sentimento é ainda presente na percepção dos cidadãos dos Estados Unidos com relação aos demais países e povos, dando suporte às decisões políticas que envolvem guerras e conflitos como, por exemplo, os eventos que sucederam o “11 de Setembro” e a missão do povo cristão estadunidense em exterminar o “Eixo do Mal” e garantir a existência de um suposto ambiente democrático no Oriente Médio.  
O fortalecimento desse espírito no imaginário do cidadão estadunidense (e que conquista cidadãos aliados à causa estadunidense de diversas partes do mundo) contribui para que haja um sólido apoio da população frente às decisões, por vezes polêmicas, do governo dos Estados Unidos, em nome da manutenção da paz, da liberdade e prosperidade da democracia e dos valores individuais.  
Um exemplo ilustrativo do resquício do sentimento religioso do Destino Manifesto é a parte final do discurso do atual Presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, em 02 de Maio de 2011 ao anunciar a morte de Osama Bin Laden, inimigo declarado da nação: 

"Esta noite, mais uma vez lembramos que os Estados Unidos podem fazer tudo a que se determinar fazer. Essa é a história de nossa história, seja a busca da prosperidade para nosso povo, ou a luta pela igualdade de nossos cidadãos; nosso compromisso é lutar pelos nossos valores no exterior, e nossos sacrifícios é fazer do mundo um lugar mais seguro. Deixem-nos lembrar de que podemos fazer essas coisas não apenas por riqueza e poder, mas por causa do que somos: uma nação, sob um Deus, com liberdade e justiça para todos. (...) Que Deus  abençoe os Estados Unidos da América" (FOLHA DE SÃO PAULO, 2011) 


Referências Bibliográficas:

FERES JÚNIOR, João. Spanish America como o Outro da América, Revista Lua Nova, n.62, São Paulo, CEDEC, 2004, p. 69-89.
  
FOLHA DE SÃO PAULO, Discurso de Obama sobre a morte de Bin Laden, São Paulo, 02 de Maio de 2011. 

MOUNTJOY, Shane.  Manifest destiny: westward Expansion. Milestones in American History. Infobase Publishing. New York, 2009 

O’SULLIVAN, John. "Annexation" United States Magazine and Democratic Review 17, no.1 (July-August 1845): 5-10 http://web.grinnell.edu/courses/HIS/f01/HIS202-01/Documents/OSullivan.html - Última vez acessado em 26/07/2011. 

OLÍMPIO, Marise Magalhães; MAIA, Jorge Henrique. Estados Unidos e o Destino Manifesto. Disponível em http://meuartigo.brasilescola.com/historia-geral/estadosunidosdestino-manifesto.htm - Última vez acessado em 26/01/2011 

RAMOS, André L. A., MIRANDA, Augusto R. A. Religião Civil, Destino Manifesto e Política Expansionista Estadunidense. Ameríndia, vol. 4, número 2/2007 

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