Entre os significados de rapina encontra-se o ato de praticar o roubo ardiloso, velhaco, espertalhão
15/02/2012
Editorial ed. 468
No dia 25 de janeiro, no Estádio Pacaembu, em São Paulo, o presidente em exercício da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), José Maria Marin, aos 79 anos de idade, tratou de surrupiar uma das medalhas de ouro, destinadas aos jogadores do Corinthians, time campeão a Copa São Paulo de Juniores/2012. Marin já foi deputado estadual, vice-governador de São Paulo na chapa de Paulo Maluf – por 10 meses foi governador paulista – e, em 2008, recebeu do Ministério Público do Estado de São Paulo o “Colar do Mérito Institucional do Mistério Público”. Ao que indica, o colar foi insuficiente para aplacar a sede de medalhas do velho cartola do futebol. No momento em que embolsava a medalha, Marin estava representando o presidente da CBF, Ricardo Teixeira - que está na mira da Policia Federal e do Ministério Público sob suspeita de enriquecimento ilícito, lavagem de dinheiro e recebimento de propina, junto com outros dirigentes da Federação Internacional de Futebol (Fifa). O futebol brasileiro e os milionários negócios envolvendo a Copa do Mundo de 2014 estão nas mãos dessa dupla.
Para alguns, o roubo da medalha no Pacaembu foi hilário. Até poderia ser, se o gesto flagrado elas câmeras de televisão não evidenciasse a facilidade e a impunidade com que as elites promovem a rapinagem da riqueza produzida pelo povo brasileiro.
Em 2011 a indústria automobilística, instalada no Brasil, enviou 5,58 bilhões de dólares em lucros e dividendos para suas matrizes no exterior. Esse montante é 36% superior ao valor enviado em 2010. No mesmo período a produção de automóveis aumentou apenas 0,7%. E é essa mesma indústria que reclama incessantemente da carga tributária do nosso país, constantemente reivindica incentivos fiscais e financiamentos públicos de investimentos e não aceita qualquer interferência do Estado nos problemas existentes na cadeia produtiva das montadoras, sejam ambientais ou trabalhistas.
E, pasmem! A quantia de 5.58 bilhões de dólares não é resultante do controle do Banco Central (BC) sobre as remessas de lucros enviadas ao exterior. Essa foi a quantia que os próprios fabricantes de veículos registraram. O BC não publica nem a lista das empresas que remetem seus lucros e muito menos, os valores individuais envolvidos. Como as empresas também não publicam essas informações, a riqueza é extraída daqui de forma quase sigilosa, prática dos que temem prestar conta dos seus atos.
O Banco Itaú se vangloria de ter alcançado, em 2011, o maior lucro da história do sistema financeiro nacional. Açambarcou R$ 14,6 bilhões. Essa riqueza concentrada na forma de lucro de um banco, para alguns, atesta a vitalidade da economia brasileira. Mas esconde e agudiza a gritante e vergonhosa desigualdade social e econômica existente em nosso país. No mesmo período, em 2011, o Itaú fechou 4.058 postos de trabalho. E as tarifas de serviços que cobra dos seus clientes representam quase uma vez e meia as despesas de pessoal do banco. Será por coincidência que esse banco é um dos principais patrocinadores da CBF comandada por Ricardo Teixeira?
Em meados do ano passado, o Instituto Nacional de Estudos Socioeconômicos (Inesc) divulgou estudo mostrando que, somente em 2009, cerca de 60 bilhões de dólares saíram do Brasil diretamente para os chamados paraísos fiscais. Como se sabe, os países tidos como paraísos fiscais atraem dois tipos de crimes: a lavagem de dinheiro (dinheiro do crime, droga, contrabando, tráfico de armas e seres humanos, corrupção, etc.) e a sonegação fiscal.
Em 2004, a CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) do Banestado – comprado pelo Banco Itaú no processo de privatização – estimou que o envio irregular de dinheiro aos paraísos fiscais, por meio das contas CC5, chegaria a R$ 150 bilhões. A mesma CPI sugeriu o indiciamento de 91 pessoas envolvidas nessas remessas irregulares de dinheiro ao exterior. Até o momento não há noticias da existência de processos contra essas pessoas e muito menos da recuperação de, pelo menos, parte desse dinheiro depositado no exterior. Aquela CPI, depois de um acordão entre PT e PSDB, perdeu uma oportunidade histórica de punir os que roubam o povo brasileiro.
No final de 2011, o jornalista Amaury Ribeiro Jr. lançou o livro A Privataria Tucana, com farta documentação mostrando a roubalheira do patrimônio publico que ocorreu através do programa de privatização feito no governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e que enriqueceu o ex-governador de SP, José Serra, sua filha e um seleto grupo de pessoas próximas a ele. As acusações são graves e documentadas. Há uma CPI instalada e espera-se que ela não tenha o mesmo fim que teve a CPI do Banestado. Enquanto isso, o ex-governador tucano escafedeu-se num silencio típico dos que sabem que não têm resposta às acusações. Mais estranho ainda é o silencio do Ministério Público Federal, do Poder Judiciário e da Polícia Federal. Só servem para averiguar e punir os ladrões de galinhas?
A medalha surrupiada no Pacaembu continua em poder do cartola, enquanto providenciaram outra para seu legitimo dono, o goleiro do time campeão da Copinha.
As bilionárias e contínuas quantias de dinheiro enviadas para exterior, concentradas nos lucros dos bancos, depositadas em paraísos fiscais, fazem falta na construção de moradias populares, no sistema de saúde e educação, no saneamento, no transporte público; na reforma agrária. Diminuir a pobreza extrema e combater a desigualdade social existente na 6ª economia mundial exige enfrentar e combater os privilégios dos que acumulam uma imoral e, não raras vezes, ilegal riqueza. Política que nenhum governo, até o momento, sinaliza disposição nem coragem para implementar.
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