sábado, 19 de janeiro de 2013

Por um serviço público de qualidade para o cidadão brasileiro

 

Por Pedro Barreto 

 

O discurso que clama por mais “eficiência” e “produtividade” no serviço público brasileiro só me faz ter mais certeza a respeito da necessidade de se fortalecer as instituições estatais públicas e gratuitas em nosso país. As reportagens veiculadas na TV Globo, acerca do favorecimento de empresas prestadoras de serviço no Hospital Universitário Clementino Fraga Filho da UFRJ e, a mais recente, que tratou do suposto desvio de recursos públicos na mesma universidade são exemplos deste vigoroso discurso. Tal retórica é norteada por uma lógica capitalista de administração que beneficiaria os clientes de empresas, guiadas pela “missão” e “visão” de garantir maior “eficiência” e “produtividade”.

Inicio minha argumentação enfatizando, em primeiro lugar, que defendo, acima de tudo, a transparência na gestão pública. Para tal, foi sancionada, em novembro de 2011, a Lei 12.527, ou Lei de Acesso à Informação. A partir desta, os órgãos públicos têm a obrigação de tornar  transparentes suas receitas e despesas, entre elas, o salário de seus servidores. Aqueles que, incialmente se opuseram, com o tempo, estão passando a perceber a relevância de tal medida, inclusive para evidenciar a defasagem dos salários de diversas categorias de trabalhadores, cujas reivindicações por reajustes dão origem a paralisações, ao mesmo tempo, intermináveis e inegavelmente legítimas.

Quando fala-se em produtividade e eficiência, há dois aspectos a serem considerados. O primeiro é que, obviamente, a avaliação e a fiscalização incansável dos servidores públicos são fundamentais para se garantir uma prestação de serviço digna para a toda a população. No caso específico das universidades públicas federais, é essencial avaliar os professores, pesquisadores (que recebem bolsas de pesquisa de instituições de financiamento) e servidores técnico-administrativos, para extinguir figuras como a do “barnabé”, aquele funcionário que passa o horário de expediente fumando, tomando cafezinho, em conversas de corredor, ou navegando nas redes sociais e sites e entretenimento, em vez de executar o trabalho devido. Apesar de ainda existir hoje em dia (em empresas públicas e também privadas), tal figura está longe se ser a regra no funcionalismo público. No entanto, a sanha privatista que se apossou de nossos governantes na década de 1990 perpetuou essa imagem no senso comum.

Os desvios de conduta, má gestão e improbidade administrativa também são injustificáveis. A apuração e investigação de denúncias, via corregedorias, controladorias, tanto internamente, como por parte dos respectivos órgãos governamentais, devem ser implacáveis e não podem ser substituídas por argumentos tais como a “tradição” e a “excelência” de instituições, autoproclamadas “inatacáveis”.

No entanto, o segundo aspecto fundamental a ser considerado é que não se deve aplicar às instituições públicas a mesma lógica das empresas privadas. A diferença elementar entre elas é que, enquanto estas atendem clientes, aquelas prestam serviços ao cidadão. O cliente reivindica seus direitos enquanto consumidor de um determinado produto e paga por este bem ou serviço. Já o cidadão tem o direito legal, constitucionalmente garantido, de receber um serviço público, gratuito e de qualidade, tal como garante a Carta Magna deste país, independentemente de sua cor, sexo, origem ou classe social.

O modo de produção capitalista, em sua fase neoliberal, transformou os cidadãos em potenciais consumidores. Aqueles que não possuem recursos para se inserirem na condição de clientes de determinadas empresas são, imediatamente, destituídos de sua cidadania e entregues à própria sorte. Ademais, a prestação de serviços por parte das empresas privadas segue, sobremaneira, a lógica do mercado. Se um serviço dá lucro, ele é valorizado, se não, é relegado. Simples assim. As instituições públicas jamais poderão abrir mão de seu papel de prestadoras de serviços públicos gratuitos e de qualidade, em benefício de interesses mercadológicos, que favoreçam, primordialmente, consumidores e não os cidadãos.

A onda de privatizações de empresas públicas, vigorosa nos anos 1990, deu origem às terceirizações nos anos 2000. Os serviços de saúde no município do Rio de Janeiro são o maior exemplo disto, através da criação das UPAs. A Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), em discussão na comunidade acadêmica da UFRJ e em outras universidades públicas do país, segue a mesma lógica na esfera federal. Em comum, entre outros aspectos, está a possibilidade da terceirização da mão-de-obra e a consequente precarização dos vínculos trabalhistas, além, é claro, de abrir portas para a orientação de seus serviços a partir da lógica do mercado, privilegiando a prestação de um serviço mais vantajoso economicamente para a empresa do que outro mais oneroso e de menor retorno financeiro.

O mesmo pensamento privatista está em curso, há algum tempo, nas universidades públicas brasileiras, a partir do financiamento de pesquisas – por organismos privados e mesmo públicos –, que, orientado pela lógica do mercado, estimula os pesquisadores a produzirem conhecimento com esta finalidade, em detrimento de uma análise crítica, finalidade acadêmica imprescindível. Isto talvez explique o maior volume de recursos investido em áreas como energia, tecnologia e medicamentos, em prejuízo de pesquisas em outras áreas, como a das Ciências Humanas.

Por esta razão, as instituições públicas devem ser fortalecidas e ter assegurado o seu papel de prestadoras de serviços gratuitos e de qualidade. Por este motivo a universidade pública brasileira deve ter preservada, ressaltada e consolidada a sua função de formadora de um pensamento crítico. Simples assim.

Pedro Barreto é jornalista e mestre em Comunicação Social pela ECO-UFRJ

Fonte: Algo a Dizer

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