sábado, 7 de janeiro de 2012

Os Comunistas por Pablo Neruda

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Passaram-se alguns anos desde que ingressei no partido... Estou contente... Os comunistas formam uma boa família... Têm a pele curtida e o coração moderado... Por toda parte recebem golpes... Golpes exclusivos para eles... Vivam os espíritas, os monarquistas, os anormais, os criminosos de todas as espécies... Viva a filosofia com muita fumaça e pouco fogo... Viva o cão que ladra e que morde, vivam os astrólogos libidinosos, viva a pornografia, viva o cinismo, viva o camarão, viva todo o mundo, menos os comunistas... Vivam os cintos de castidade, vivam os conservadores que não lavam os pés ideológicos há quinhentos anos... Vivam os piolhos das populações miseráveis, viva a fossa comum gratuita, viva o anarco-capitalismo, viva Rilke, viva André Gide com seu coridonzinho, viva qualquer misticismo... Está tudo bem... Todos são heróicos... Todos os jornais devem sair... Todos podem ser publicados, menos os comunistas... Todos os políticos devem entrar em São Domingos sem algemas... Todos devem celebrar a morte do sanguinário, de Trujillo, menos os que mais duramente o combateram... Viva o carnaval, os últimos dias de carnaval... Há disfarces para todos... Disfarces de idealista cristão, disfarces de extrema esquerda, disfarces de damas beneficentes e de matronas caritativas... Mas cuidado: não deixem entrar os comunistas... Fechem bem a porta... Não se enganem... Eles não têm direito a nada... Preocupemo-nos com o subjetivo, com a essência do homem, com a essência da essência... Assim estaremos todos contentes... Temos liberdade... Que grande coisa é a liberdade!... Eles não a respeitam, não a conhecem... A liberdade para se preocupar com a essência... Com o essencial da essência...

Assim têm passado os últimos anos... Passou o jazz, chegou o soul, naufragamos nos postulados da pintura abstrata, a guerra nos abalou e nos matou... Tudo permanecia o mesmo... Ou não permanecia?... Depois de tantos discursos sobre o espírito e de tantas pauladas na cabeça, alguma coisa ia mal... Muito mal... Os cálculos tinham falhado... Os povos se organizavam... Continuavam as guerrilhas e as greves... Cuba e o Chile se tornavam independentes... Muitos homens e mulheres cantavam a Internacional... Que estranho... Que desanimador... Agora cantam-na em chinês, em búlgaro, em espanhol da América... É preciso tomar medidas urgentes... É preciso bani-lo... É preciso falar mais do espírito... Exaltar mais o mundo livre... É preciso dar mais pauladas... É preciso dar mais dólares... Isto não pode continuar... Entre a liberdade das pauladas e o medo de Germán Arciniegas... E agora Cuba... Em nosso próprio hemisfério, na metade de nossa maçã, estes barbudos com a mesma canção... E para que nos serve Cristo?... Para que servem os padres?... Já não se pode confiar em ninguém... Nem mesmo nos padres. Não vêem nossos pontos de vista... Não vêem como baixam nossas ações na Bolsa...

Enquanto isso sobem os homens pelo sistema solar... Deixam pegadas de sapatos na Lua... Tudo luta por mudanças, menos os velhos sistemas... A vida dos velhos sistemas nasceu de imensas teias de aranha medievais... Teias de aranha mais duras do que os ferros das máquinas... No entanto, há gente que acredita numa mudança, que tem posto em prática a mudança, que tem feito triunfar a mudança, que tem feito florescer a mudança... Caramba!... A primavera é inexorável!

Pablo Neruda - Confesso que vivi


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A sua História:

Nome literário do poeta, diplomata e marxista chileno Neftalí Ricardo Reyes Basoalto. Nasceu a 12 de julho de 1904 em Parral, no Chile, e morreu a 23 de setembro de 1973, em Santiago. De família humilde, viveu no sul do Chile, em Temuco. A mãe faleceu uns meses após o seu nascimento e o pai voltaria a casar. Neruda viria a ter um bom relacionamento com a madrasta, que considerou como a sua verdadeira mãe. Escreveu um dia "eu nasci para a vida, para a terra, para a poesia e para a chuva". Estudou no liceu desta cidade, entrando aos 15 anos no Instituto Pedagógico da Universidade de Santiago. Começou a escrever aos 10 de idade. Quando tinha apenas 12 anos conheceu Gabriela Mistral, uma famosa poetisa chilena, que lhe deu a conhecer os escritores clássicos que iriam influenciar a sua carreira e as suas decisões políticas. Tornou-se militante anarquista e traduziu o trabalho de Jean Grave, a notável teoria de Peter Kropotkine, um anarquista comunista. A partir de 1920 passou a usar o nome Pablo Neruda, que legalmente adotou em 1946. Em 1921 deixou Temuco e mudou-se para a capital, Santiago. O estudante romântico invadiu a vida literária da capital chilena com a sua capa de estudante. Neste ano ganhou o prémio da federação chilena de estudantes de poesia com La canción de la fiesta e a partir daí começou a publicar poemas na revista da federação, Claridad. Em 1923 escreveu o primeiro livro, Crepusculario . Para cobrir as despesas desta publicação viu-se obrigado a vender o relógio que o pai lhe tinha oferecido. Em 1924 encontrou quem lhe publicasse Viente poemas de amor y una canción desesperada . Este trabalho foi muito bem recebido pelo público e conservou a sua popularidade ao longo dos anos. Aos vinte anos e com dois livros publicados, Neruda tornou-se o poeta chileno mais conhecido. Abandonou os estudos de francês para se dedicar inteiramente à poesia. Escreveu Tentativa del hombre infinito ,Anillos, em colaboração com Tomás Lago, e El hondero entusiasta .Em 1927 foi nomeado cônsul em Rangoon, Burma, e durante cinco anos representou o seu país na Ásia. Seguidamente viajou para Ceilão, Colombo, Jacarta, Java, onde casou com a sua primeira mulher, de origem holandesa. Esteve ainda em Singapura. Viveu um período de grande solidão, animado apenas pelo romance com uma jovem burmesa. Durante estes anos na Ásia escreveu Residencia en la tierra . Em 1933 foi nomeado cônsul em Buenos Aires e daí data a sua amizade com o poeta espanhol Federico García Lorca. No ano seguinte foi transferido para Barcelona e depois para Madrid onde voltou a casar, desta vez com Delia del Carril. Com o mesmo impacto literário que obteve no seu país, Neruda conquistou a Europa e o resto do mundo, a sua poesia tornou-se rapidamente conhecida. Foi um escritor bem acolhido em Espanha. Este clima de desenvolvimento poético foi subitamente interrompido pelo eclodir da guerra civil espanhola em 1936. A execução do seu amigo García Lorca, a prisão de Miguel Hernández e o sangue nas ruas contribuíram para a maturidade do poeta e para as suas atitudes políticas. Escreveu então Espanã en el corazón , publicado durante a guerra civil nas linhas da frente republicanas. Pablo Neruda regressou ao Chile em 1938, com um grupo de refugiados espanhóis. Depois desta atitude, o governo chileno mandou-o para o México onde produziu intensamente textos poéticos, inspirado na II Guerra Mundial, que assolava a Europa, posicionando-se especialmente ao lado da defesa de Estalinegrado contra a ocupação germânica. Em 1943 voltou ao Chile por mar, recebendo uma grande ovação dos seus conterrâneos. Em 1945 foi eleito senador e nos três anos seguintes consagrou a maior parte do seu tempo aos problemas do país. A atividade política de Neruda foi interrompida quando foi eleito um governo de direita. Pablo Neruda, comunista, foi forçado a ocultar a sua ideologia, assim como outros esquerdistas. Estes anos de clandestinidade foram, no entanto, proveitosos do ponto de vista da obra literária. Escreveu Canto General , um dos grandes poemas épicos escritos no continente americano. Em fevereiro de 1948, deixou o Chile, atravessando a zona sul das montanhas dos Andes a cavalo. Em junho de 1949 visitou a União Soviética para participar na celebração dos 150 anos de Aleksandr Pushkin. Visitou depois outros países da Europa e o México. Em 1952, depois da ordem para prisão dos escritores de esquerda e de figuras políticas terem sido retiradas, Neruda regressou ao Chile e casou pela terceira vez, com a chilena Matilde Urrutia. Com a sua residência na Ilha Negra, no Pacífico, viajou constantemente por vários países, entre os quais Cuba e Estados Unidos, respetivamente em 1960 e 1966. A sua poesia foi traduzida em quase todas as línguas. A poesia de Neruda representa uma constante mudança, relacionada com as experiências da sua vida. Um dos mais enigmáticos trabalhos é Residencia en la tierra onde rompeu com a forma tradicional e criou uma técnica poética altamente personalizada embora plena de realismo, que se tornou conhecida como "nerudismo". Pablo Neruda foi Prémio Nacional de Literatura, Prémio Lenine da Paz (1953) e Prémio Nobel da Literatura (1971).

Um comentário:

  1. Bonito blog,
    Caso seja oportuno, recomendamos
    "Que cem flores desabrochem! Que cem escolas rivalizem!"
    http://cemflores.blogspot.com
    email: cem.flores.desabrochem@gmail.com
    a)Equipe do blog

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